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No penúltimo dia útil à frente da Procuradoria-Geral da República, Rodrigo Janot gastou sua flecha mais afiada, aquela equivalente à bala de prata como metáfora de uma arma poderosa para atingir determinado alvo. De uma tacada só, Janot denunciou Michel Temer e seis amigos diretos do presidente: os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco, os ex-ministros Geddel Vieira Lima, Henrique Eduardo Alves, o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, o homem da mala de R$ 500 mil. Temer foi denunciado também por embaraço à investigação (obstrução da Justiça), junto com Ricardo Saud e Joesley Batista.
A inclusão de Joesley e Saud na denúncia significa que o acordo de delação premiada foi rescindido porque os dois omitiram informações. Com base na lei que trata da colaboração premiada, o entendimento do procurador é de que, mesmo com a rescisão do acordo, as provas apresentadas pelos donos e executivos da JBS são válidas.
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A situação de cada um dos seis amigos de Temer é distinta: Padilha e Moreira Franco estão entre os ministros mais poderosos do Planalto, Geddel, Alves e Cunha amargam uma temporada na prisão e Rocha Loures cumpre prisão domiciliar. Saud e Joesley também estão presos.
Na denúncia de mais de 200 páginas, Janot diz que Temer e os demais integrantes do que se convencionou chamar de "quadrilhão do PMDB" usaram de suas funções para cometer ilícitos e que havia uma divisão de tarefa, como é comum nas organizações criminosas. Sobre Temer pesa a acusação adicional de ter tentado barrar a investigação, mediante a compra do silêncio do doleiro Lúcio Funaro por Joesley e Saud.
O procurador quantifica o desvio supostamente praticado pelos pemedebistas em R$ 587 milhões. Pede que esse valor seja devolvido aos cofres públicos, junto com outros R$ 29 milhões a título de multa.
A ironia da peça apresentada pelo procurador é a epígrafe: Janot escolheu uma frase de Ulysses Guimarães para a introdução da denúncia: "O poder não corrompe o homem; é o homem que corrompe o poder. O homem é o grande poluidor, da natureza, do próprio homem, do poder. Se o poder fosse corruptor, seria maldito e proscrito, o que acarretaria a anarquia.".
O que vai ocorrer daqui para a frente com Janot fora da chefia do Ministério Público? Os próximos capítulos não dependem da Procuradoria-Geral da República. Caberá ao ministro Edson Fachin decidir se aceita ou não a denúncia. Se aceitar, caberá à Câmara autorizar o processo contra Temer ou arquivar a denúncia, como fez com a primeira, por corrupção passiva.
Conseguirá Temer repetir o resultado do julgamento anterior? Antes de começar a arregimentar os votos para arquivar essa segunda denúncia, Temer está tentando retardar a chegada à Câmara. A primeira providência da defesa foi pedir ao Supremo Tribunal Federal para que não encaminhe o documento antes da conclusão do julgamento suspenso na quarta-feira, em que Temer questiona as provas apresentadas por Joesley, já que o acordo foi rompido porque os delatores omitiram informações.