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Acreditar no Brasil é um desafio grande demais. Não é ponto de partida. É o de chegada. As manchetes de Brasília e de Curitiba nos empurram para o abismo da desconfiança. Não tem jeito.
A sujeira é grande demais. A roubalheira bilionária carrega tantos zeros e cifras, que sequer conseguimos compreendê-la. O festival de mentiras é descarado e gigantesco. Os abusos de autoridade, o furor condenatório, a defesa inconsistente.
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Caímos numa armadilha. Nesse móbile de mercados e humores, sempre que alguém perde, outro alguém ganha.
Ganha o discurso do radicalismo, ganha a indústria do desespero, ganha quem apostou no fracasso. Porque acreditar no Brasil, eu já escrevi antes, é hoje um desafio grande demais.
Iremos recuperar o orgulho e a esperança. É uma construção, que começa com o resgate da confiança uns nos outros. Não é Brasília. É o colega, o taxista, o frentista, o vizinho, o médico, o advogado, o engenheiro, o irmão, o policial, é também o adversário, por que não? A confiança é uma rede que se tece fio a fio. Não nasce grande, nasce em casa. E só depois se espalha pela rua, pelo bairro, pela cidade e pelo país.
Durante a semana, conversei com o Manoel Soares, colega que aprendi a admirar desde quando entrou para a RBS TV. Fazia reportagens para o Jornal do Almoço e para o TeleDomingo. Hoje, está entre Rio e São Paulo trabalhando para a Globo.O Manoel me contou sobre sua adaptação, sobre as alegrias do novo desafio. Relatou-me a conversa com um morador de uma favela paulistana, que veio testá-lo. “Tu é contra ou a favor do Temer?”.
O Manoel já foi morador de rua. Disputou comida com ratos. Não iria se apertar: “A direita sempre me ignorou e a esquerda nunca me contemplou”, foi o que disse o Manoel, um dos milhões de brasileiros que estão além desse debate superado. O debate que se alimenta nele mesmo e que não consegue olhar além do “ter razão”.
Sem direita e sem esquerda, o Manoel acreditou. No vizinho, no colega, no frentista, no futuro, nele mesmo.
Parar de olhar tanto para Brasília e olhar mais para os lados. Seria um caminho. Olhar para os lados como um convite a olhar para a frente.