Encontro nas palavras do ministro Gilmar Mendes uma síntese do sentimento da maioria da população ao que vivenciamos hoje: "Olhando-se o mal-engendrado conjunto formado por esse impressionante ciclo de descalabros, tem-se a viva impressão de que nossa combalida República parece ter sido tomada de assalto por empedernida trupe de insensatos".
As expressões "ciclo de descalabros" e "trupe de insensatos" são brandas em sua intensidade e comedidas em sua moderação para descreverem a gravidade dos fatos e circunstâncias reveladores de engenhosa máquina de corrupção concebida com artifício e destreza e que transformaram o Estado Brasileiro em um balcão de negócios como nunca visto antes.
A historiografia brasileira registra ciclos de promiscuidade pelas vias do corrompimento. No período colonial, o contrabando e propinas no comércio ilegal de pau-brasil, especiarias e ouro. No Império, o tráfico de escravos, ainda que proibido por lei. Na República a corrupção eleitoral e a concessão de obras públicas. A primeira, como um objeto sui generis de enriquecimento fácil e rápido associado ao descumprimento de compromissos eleitorais e à influência e subordinação aos interesses de grupos econômicos. A segunda, ligada à obtenção de contratos junto ao governo para execução de obras públicas ou à conquista de concessões ou permissões para a prestação de serviços públicos pelo setor privado.
Atualmente, a corrupção alcançou limites inimagináveis e os "insensatos" superaram-se fazendo a República ruir, deixando os poderes constituídos vivendo a descrença popular de serem capazes da "sensatez" e responsabilidade necessárias para "limpar" e "recomeçar".
Para o ministro Mendes: "O Brasil requer políticas públicas eficientes em vez de estratégias publicitárias. O Brasil clama por planejamento realista e execução competente, ao invés de ilusões pirotécnicas". Com a devida vênia, reitero ser preciso fazer da indignação dos "sensatos" o combustível para reinventar um novo país. Fazer do "jeitinho brasileiro", do "levar vantagem em tudo", do "rouba, mas faz", da impunidade, da falta de ética e espírito republicano e da submissão do interesse público, práticas banidas e tornadas um capítulo da história recente a ser lembrado de modo a não recrudescer nas futuras gerações.