
O impasse sobre o recolhimento dos entulhos da reforma do Estádio Beira-Rio, nos últimos dias, levantou o debate sobre qual seria o destino correto para os resíduos das obras em Porto Alegre. A previsão de demolição do estádio Olímpico multiplica a preocupação. De um lado, os transportadores reclamam da falta de locais adequados para o descarte das sobras da construção civil. A situação levou a categoria a paralisar suas atividades na tarde desta terça-feira. Eles pretendem trancar a Avenida Bento Gonçalves na manhã de quarta-feira para chamar a atenção para o problema.
- Não temos mais para onde levar caliça. Estamos sem destino. Precisamos de um local, senão não podemos continuar trabalhando-, diz Patrícia Soares dos Santos, funcionária da Gaúcha Entulhos.
Fiscais de trânsito de Canoas bloquearam o acesso a entradas da cidade
Foto: Prefeitura de Canoas

As empresas que realizam a coleta de lixo misturado (que não passa por triagem) na Capital costumavam direcionar o material para a Central Jorge Lanner, aterro licenciado em Canoas. Desde a semana passada, porém, um decreto emitido pelo prefeito Jairo Jorge proibiu a entrada de caminhões com lixo de outras cidades. Agentes de trânsito e da guarda municipal foram encarregados de garantir, pela fiscalização, o cumprimento da medida. As entradas da cidade foram fechadas, e os caminhões passaram por vistorias antes de seguirem adiante. Alguns foram impedidos de prosseguir, e tiveram que retornar.
Segundo o secretário de Meio Ambiente de Canoas, Carlos Todeschini, a medida foi necessária porque mais de 60% do material depositado no local eram proveniente de fora da cidade, sendo a maioria da Capital:
- Estava sendo muito cômodo para Porto Alegre enviar os resíduos para Canoas. Nos gerava um problema de passivo ambiental, ao lotar áreas que deviam ser usadas para outros fins, e econômico, pois nosso custo de operação era superior ao de arrecadação.
Segundo Todeschini, antes da medida, o aterro recebia em média 600 toneladas por dia de entulhos. O volume caiu para menos de 40% na última semana.
Presidente da Associação de Transportadores de Caçambas Estacionárias, Guacira Ramos da Silva diz que a paralisação será por tempo indeterminado, ou pelo menos até os caçambeiros conseguirem uma nova área para a triagem dos materiais. Sem o depósito de Canoas, a opção seria uma área no bairro Sarandi, na Capital, ainda sem licença de operação.
- Todo mundo faz obra, mas ninguém quer saber para onde vai o material. Se não tem local para depositar o lixo, a prefeitura não deveria liberar as obras - diz Guacira.
Na falta de opção, alguns caçambeiros admitem que acabam depositando o material em locais irregulares, como vilas e terrenos baldios.
Outro lado da história, explicado por Mauro Gomes de Moura, supervisor da Secretaria de Meio Ambiente de Porto Alegre, é que a cidade possui diversos pontos de recebimento de resíduos, e não falta local para a acomodação deste material. Conforme ele, os caçambeiros protestam porque querem receber o pagamento do empreiteiro mas não querem pagar para depositar o material em um local licenciado.
- Falta os empresários se conscientizarem de que a destinação final e a separação dos materiais é responsabilidade deles. A prefeitura de Canoas tem toda razão neste ponto. Eles não precisam receber os resíduos de Porto Alegre. O recolhimento deve ser responsabilidade dos empreendedores - afirma Moura.
DMLU procura locais para descarte privado
Diretor-geral do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), André Carús diz que a prefeitura não tem obrigação legal de criar um local para a iniciativa privada descartar seus resíduos. Carús explica que a cidade tem áreas privadas licenciadas para receber esses materiais, mas muitas delas operam na clandestinidade.
- Estamos procurando viabilizar áreas que recebam materiais desses caçambeiros, os intermediários entre descartadores e receptores. Esperamos que o Beco João Paris, próximo a Fiergs, no Sarandi, seja liberado em breve - afirma o diretor do DMLU.
Diariamente, cerca de 2,2 mil toneladas de entulhos são geradas na Capital. Desse total, 600 toneladas são coletadas em locais de focos irregulares. Um dos pontos clássicos de depósito clandestino é a orla do Guaíba, nas proximidades da Usina do Gasômetro e do Estádio Beira-Rio. De acordo com o novo Código de Limpeza Urbana, o descarte desse material gera uma multa gravíssima, cujo valor ultrapassa R$ 4,3 mil. No caso da beira de rios, a multa também pode ser aplicada pela Smam.
O que diz a legislação
De acordo com a Resolução nº 307, de 2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e conforme a Lei Municipal 10.847/2010, a responsabilidade pelo descarte desses resíduos é dos próprios geradores, exceto para os com descargas máximas de até 0,5 metro cúbico por dia. A lei institui o Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil do Município de Porto Alegre.
Advogado e professor na área ambiental, Gustavo Trindade explica que a nova lei de resíduos urbanos responsabiliza o próprio gerador do resíduo pelo seu destino e separação. Segundo ele, à prefeitura caberia o papel da fiscalização por meios das secretarias de Meio Ambiente e Limpeza Urbana:
- A ausência de uma fiscalização mais efetiva faz com que muitos empreendedores descartem de forma irregular. Enquanto isso acontecer, não haverá motivo para novas empresas deste ramo se instalarem por aqui.