Comportamento

Espécie invasora

Ameaça a animais e terras, javalis são caçados no pampa gaúcho

Manadas de porcos selvagens afetam o equilíbrio ambiental no Estado, atacam rebanhos de ovelhas, destroem lavouras e espalham doenças

Carlos Macedo / Agencia RBS
Primeiros animais apareceram no Estado há mais de 20 anos, vindos ou importados do Uruguai

O javali tornou-se um flagelo fora de controle no pampa gaúcho. Já ameaça a sobrevivência de aves nativas ao comer ninhadas de ovos da ema, da perdiz, do perdigão e do quero-quero, o que aborta o nascimento de filhotes. Exótico ao ambiente, também causa prejuízos ao devorar rebanhos de ovelhas e dizimar lavouras. E, para completar os danos, pode disseminar doenças (zoonoses) ao cruzar com porcos domésticos.

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A gula onívora das varas de porcos asselvajados - abocanham desde vegetais até carne - provoca tantos estragos que a caça ao animal foi liberada, com restrições, pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Até o Exército entrou na parada, para habilitar atiradores com fuzis de grosso calibre - os mais adequados ao abate.

- É problema internacional. O javali não é controlável - alerta Paulo Carniel Wagner, do centro de triagem de animais silvestres do Ibama estadual.

Técnicos do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) juntaram-se ao combate. Durante este ano, instalaram armadilhas de captura na Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã. Com 316 mil hectares, abrangendo partes de Santana do Livramento, Rosário do Sul, Quaraí e Alegrete, é uma das zonas mais ocupadas por javalis.

- Ele é um invasor exótico, sem predador por aqui, onde encontrou alimento farto e lugar para se esconder - diz Raul Paixão Coelho, chefe substituto do ICMBio em Livramento.

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Raul e seus parceiros investigam o desequilíbrio ambiental. Retiram amostras de sangue dos javalis abatidos para analisar se estão doentes. Em razão do sumiço de jovens emas - maior ave não voadora da América do Sul, podendo chegar a 1m70cm de altura -, monitoram uma região de 80 quilômetros, em Livramento.

Além de apreciar omeletes de ema e de aves rasteiras, o javali disputa o alimento com outras espécies, revolvendo a terra em busca de bulbos, raízes, cebolinhas e larvas. Também incomoda o veado, a capivara e o tatu, que debandam ante os grunhidos famintos do visitante indesejado.

- A lógica do porco selvagem é ir atrás da comida, sempre - diz Raul.

Animal virou praga em terras uruguaias

As manadas desfiguram a paisagem do pampa. De tanto fuçar e escarvar, transformam campos de pasto em lamaçais. Cavam buracos à beira de árvores - a predileção é pela sombra da coronilha -, onde se deitam para descansar e copular. Uma fêmea pode parir de oito a 12 filhotes por ano.

Não há estudos recentes sobre a população de javalis no Estado. Raul, do ICMBio, informa que um levantamento feito no Uruguai indicou a presença de 0,5 a 1,5 animal por quilômetro quadrado. O técnico acha que a média do país vizinho pode ser aplicada, sem exageros, à região da fronteira gaúcha. O Uruguai foi o primeiro a introduzir o javali, da espécie Sus scrofa, há mais de um século. Era para ficarem confinados numa estação de caça, no departamento de Colônia, mas escaparam e se multiplicaram - assim como ocorreu nos Estados Unidos, onde as autoridades perderam o controle.

Desde 1982, o javali é considerado uma praga nacional no Uruguai. A caça está liberada, sem limitação de calibre para armas de fogo. A médica veterinária Nibia Fontana, da divisão de Fauna do Ministério de Agricultura e Pesca uruguaio, admite que todas as formas para conter o animal fracassaram.

- Eles são muito rústicos e fortes. Estão fora de controle - ressalta Nibia.

O Rio Grande do Sul parece ir no mesmo caminho do Uruguai, inclusive copiando os piores exemplos. Fazendeiros uruguaios decidiram criar filhotes, de olho no sabor da carne e nos possíveis lucros. Um assado de javali servido com geleia de amora é um manjar de reis. Mas quem trata o predador como se porco fosse, acaba descobrindo que adotou uma fera que atacará seus rebanhos.

- Aqui no Uruguai, muitos produtores abandonaram a criação de ovelha - lamenta a veterinária Nibia.

* Zero Hora

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