
Pelo menos 127 mil novas vagas para qualificação profissional e ensino técnico estão congeladas no Rio Grande do Sul em razão da indefinição por parte do Ministério da Educação (MEC) quanto aos cursos gratuítos que serão realizados neste ano pelo Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). O início das inscrições - que geralmente ocorre em março - foi adiado para maio, e as aulas devem começar apenas em julho. Ainda não há informação de quantos alunos serão atendidos, o que tem levado instituições a reprogramar grades de cursos e dispensar professores.
A indefinição é nacional, e o problema não é burocrático, mas financeiro, avaliam as instituições de ensino. O governo pretendia matricular quatro milhões de alunos neste ano, mas o corte de gastos que atinge especialmente a educação teria levado a uma revisão de orçamento. Educadores avaliam que o número de vagas dificilmente passe de 700 mil no Brasil em 2015, menos da metade da média anual de 2 milhões de matrículas.
O cenário leva as escolas gaúchas a projetarem treinar menos gente neste ano. O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense (Ifsul), que oferece cursos em 13 municípios, deve abrir mil vagas pelo Pronatec no primeiro semestre, apenas uma fração das 3,9 mil abertas no ano passado.
- Nossa intenção é ofertar número semelhante de vagas de 2014. Contudo, isso dependerá dos recursos a serem distribuídos pelo governo e também da demanda - explica Manoel José Porto Júnior, pró-reitor de Extensão e Cultura do Ifsul.
A indefinição esfria a articulação entre instituições de ensino, prefeituras e sindicatos para solicitarem ao Ministério da Educação abertura de novas turmas pelo Pronatec. No final de cada semestre, as escolas enviam ao MEC pedidos de pactuação de vagas, conforme demanda local. Sem a previsão do MEC em 2015, os pedidos não foram feitos.
No Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), por exemplo, ainda não há previsão de nenhuma nova turma neste ano. No ano passado, foram atendidos 1,3 mil produtores em cursos como Horticultura, Piscicultura e Assistente de Planejamento. O quadro é semelhante nos serviços nacionais de Aprendizagem Industrial (Senai) e Comercial (Senac), órgãos que geram o maior número de vagas do programa.
- Esse atraso compromete a geração do mesmo número de vagas do ano passado. Não há tempo para repetir a quantidade de turmas se as aulas começam mais tarde - explica Carlos Trein, diretor de operações do Senai-RS.
Criado em 2011, o Pronatec é uma das principais bandeiras do governo federal na educação. Ministros e a presidente Dilma Rousseff costuma marcar presença em formatura de alunos. Em abril do ano passado, Dilma esteve no Rio Grande do Sul para acompanhar a entrega de certificado a um grupo de mil estudantes.
Em agosto de 2013, a presidente havia desembarcado no Estado para inaugurar o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado (IFRS) em Osório. A unidade atendeu 260 estudantes em 2014 em cursos como recepcionista e ajudante de obras e, neste ano, ninguém sabe como a unidade será ocupada.
- Há outros cursos ocorrendo, mas pelo Pronatec as turmas estão vazias - diz uma funcionária da unidade, que pede para não ser identificada.
Procurado pela reportagem, o MEC informou que as vagas ainda estão sendo pactuadas, por isso não há como confirmar a quantidade de novas turmas para este ano. Quanto aos pagamentos, informou que a situação está sendo regularizada.
Cursos já iniciados são paralisados
Cursos do Pronatec em andamento também têm sofrido com o aperto no orçamento do Ministério da Educação (MEC). ZH apurou que turmas foram paralisadas em razão da falta de repasse de verbas, principalmente em autarquias federais no Interior. Na Capital, onde as aulas são promovidas por entidades como os serviços nacionais de aprendizagem Industrial (Senai) e Comercial (Senac), algumas turmas têm sido reunidas numa mesma sala para reduzir custos.
- Há pagamentos atrasados desde o segundo semestre do ano passado, mas pretendemos levar até o fim as aulas já iniciadas - afirma Carlos Trein, do Senai-RS.
O governo admite o atraso. Em fevereiro, o MEC liberou R$ 119 milhões para pôr em dia pagamentos atrasados do ano passado. A escolas, entretanto, consideram o valor insuficiente. O presidente do Sistema Fecomércio-RS, que inclui o Senac, Luiz Carlos Bohn, afirma que os módulos em andamento não serão suspensos, mas não serão abertas novas turmas enquanto os repasses não forem regularizados. Em razão do atraso nos pagamentos, o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat), que oferece cursos nas áreas de transporte e logística, decidiu não pleitear vagas neste ano.
O quadro deixa em compasso de espera quem apostou na formação técnica para melhorar de vida. Merendeira em uma escola estadual, Norma Terezinha Rumpel Pinto, 53, começou um curso de padaria em junho do ano passado no Instituto Federal Farroupilha em São Vicente do Sul, a 90 quilômetros de Santa Maria. Era a chance para alcançar um velho sonho: abrir sua própria padaria.
- Era para as aulas práticas começarem em fevereiro, mas acabaram adiadas. Enquanto essa questão do orçamento não for resolvida, não tem certificado, e nem padaria - diz, com humor.
A turma tem 18 alunas, que diariamente trocam torpedos para saber se há notícia da volta às aulas. Algumas se anteciparam e passaram a aplicar os conhecimentos nas próprias cozinhas, para não deixar o aprendizado esfriar. Conforme a coordenação do curso, é preciso aguardar a definição do orçamento do Pronatec para 2015 para retomar as aulas.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Educação informou que as vagas ainda estão sendo pactuadas, por isso não há como confirmar a quantidade de novas turmas para este ano. Quanto aos pagamentos, informou que a situação está sendo regularizada.