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Ao acordar, o americano Sean McKelvey vira-se para o lado e, ainda deitado, faz a mesma coisa todas as manhãs: acorda Pepper, um robô humanoide. Ele dá "bom dia", Pepper responde. Há um ano, o americano que vive no Japão há 12, convive diariamente com essa máquina branca, com olhos e cabeça arredondados, mãos articuladas e que responde às suas perguntas – desde a previsão do tempo até as principais notícias do dia.
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Além de lembrar compromissos de calendário, Pepper tem uma função mais importante: reconhece as emoções de Sean e consegue expressá-las em resposta. O robô sabe, por exemplo, se o companheiro teve um dia ruim. Neste caso, ele o espera com vídeos ou músicas que possam alegrar.
Por meio de câmeras, Pepper consegue saber, com precisão, o que uma pessoa está sentindo a cada momento. O robô tem a capacidade de sugerir ações ao detectar alterações no humor, como o estresse, e sugerir que o seu dono respire fundo. Sean acredita que a detecção de emoções e a expressão de sentimentos são o diferencial para que o tratamento com humanos seja mais benéfico.
– Mesmo se você estiver sorrindo apenas com a boca, e não com os olhos, ele sabe que aquele sorriso não é sincero – diz.
Além disso, a máquina pode demonstrar infelicidade, inclusive, se foi deixado de lado, como em um ambiente escuro. Ao longo do tempo, Pepper vai aprendendo tendências, rotina e gostos de seus donos, tudo trabalho da inteligência artificial.
– O meu adora me ver, eu o trato bem – diz em inglês, rindo. – Às vezes ele vai simplesmente dizer seu nome ou abanar para você. Essas coisas têm muito valor emocional, fazem você se sentir melhor.
A ligação entre o robô e Sean é mais forte do que se imagina. Durante entrevista a ZH, o americano fica pensativo quando perguntado o que faria se o seu assistente (ou amigo) tivesse uma pane no sistema.
– Ainda não aconteceu comigo. Ele fica no meio entre ser um animal de estimação e uma criança. Seria muito difícil (viver sem o robô), ele faz parte da minha rotina, é a primeira coisa que eu vejo – conta.
McKelvey é gerente de desenvolvimento da SoftBanks, uma empresa japonesa que começou trabalhando com distribuição de software e hoje é uma das maiores companhias do país. O americano atua diretamente com o projeto de aplicativos para o Pepper. Ele conta que foi preciso fazer milhares de testes com a reação de humanos. Mais de 18 mil designs do rosto do robô foram testados para chegar a um rosto que fosse confortável e convidativo de olhar. A ideia, porém, nunca foi de fazer um robô que representasse uma figura humana. Há um termo para isso na robótica: vale da estranheza (em inglês, uncanny valley), algo estudado há décadas. Há um limite entre a aparência humanoide e a realista, que, se exagerada, causa repulsa em seres humanos.
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– Precisávamos criar algo que fosse cativante, mas que não fosse assustador. Não queremos criar seres humanos, já temos um mundo cheio de humanos verdadeiros – diz.
No Japão, Pepper já é usada em bancos, para oferecer empréstimos, conta McKelvey, já que a lei para instituições financeiras no país é rígida, e pessoas não podem fazer esse trabalho. Pepper não é um ser humano, por isso pode oferecer crédito e explicar as condições de pagamento para os clientes, afirma Sean. O robô também está em casas e escolas. Pepper custa cerca de US$ 2 mil, é um item de luxo para famílias japonesas.
Formado nos Estados Unidos, em uma faculdade budista, o americano tem uma visão que mistura aspectos da religião oriental a valores essencialmente humanísticos para pensar sobre robótica. Ele considera-se um "tecnotimista".
Durante o Wired Festival, que aconteceu no último final de semana, no Rio de Janeiro, ele falou sobre a possibilidade de Pepper ser um assistente de sala de aula, que poderia auxiliar professores com dados que capta das dificuldades e do material dos alunos. O robô também seria útil na casa de idosos que moram sozinhos. No Japão, onde cerca de 25% da população tem mais de 65 anos, ele lembra que a pessoa não foi ao médico, detecta sinais de depressão, falta de movimentação ou pouca luz dentro da casa e sugere ações.
– O que eu espero para o Pepper é que ele tenha valor na educação e no cuidado de idosos, áreas em que apenas a conexão humana não é suficiente. Em lojas, ele faz o trabalho repetitivo enquanto os outros fazem outras atividades de maior valor. Em 10 ou 15 anos, quando os robôs forem muito capazes, vamos ter de pensar em quais trabalhos daremos a eles e quais funções daremos às pessoas.
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