
Você, com os pelos arrepiados, calafrios, corpo tremendo, mãos e pés gelados, e o camarada ao lado, tranquilo de camiseta. Ou vice-versa. Quem não presenciou essa cena destemperada? Com a chegada do inverno - que oficialmente bate à porta dos brasileiros às 7h51min deste sábado -, a queda na temperatura afeta cada corpo de diferentes maneiras. Aquela história de que frio é psicológico não encontra aceitação na ciência - o organismo reage buscando se esquentar quando os termômetros desabam, mas o limite depende de cada um.
Nesta sexta-feira, por exemplo, com temperatura máxima de 20°C prevista para a Capital, que registrou 5,4ºC, a menor temperatura do ano, na madrugada de quinta-feira, a paisagem urbana deve exibir casacos pesados lado a lado com bermudas. Idade, peso, predisposição genética e até o hábito de se expor ou não às temperaturas baixas influenciam na sensação de frio.
Quem está acostumado com um inverno rigoroso, portanto, tende a sentir menos os efeitos do frio do que aqueles habituados a um clima mais ameno. Todos dispomos de uma reserva de calor para suportar variações intensas de temperatura, mas essa característica muda de pessoa para pessoa. Crianças de até dois anos e idosos acima dos 60, que contam com um organismo menos eficiente para manter o corpo na temperatura ideal - entre 36ºC e 37ºC -, são os que mais sofrem. Pessoas com doenças crônicas também são mais sensíveis. A orientação, em todos os casos, é aquela que passa de mãe para filho: agasalho e chimarrão (ou outra bebida quente).
Claro que o nosso frio não será aquele do vórtice polar que congelou os Estados Unidos no último inverno no Hemisfério Norte, mas, ainda assim, causa alterações no organismo. O corpo treme, os dentes batem e as extremidades ficam geladas: todas tentativas de o organismo se movimentar e gerar calor para evitar que a temperatura interna caia.
- O importante é manter o corpo quente e ficar atento aos sinais que o próprio corpo nos dá - diz Paulo Olzon, clínico geral da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
A exposição desprotegida ao clima gelado leva a risco de hipotermia, quando a temperatura interna cai abaixo de 35ºC. Além da sensação de frio, ocorre a contração dos vasos sanguíneos, uma das formas que o organismo encontra para tentar reduzir a perda de calor, explica a coordenadora dos cursos de Enfermagem da Unisinos, Márcia Travi Heurich:
- A hipotermia pode levar a um colapso do mecanismo, causando tremores, pele fria, alteração do nível de consciência, da frequência cardíaca e respiratória.
Agora, se o corpo está aquecido e o clima convidativo, nada impede uma caminhada e mesmo a prática de esportes em locais abertos. Passeios são inclusive recomendados.
E lá vem ele, o El Niño
Chuvoso e frio, mas menos rigoroso do que no ano passado, quando houve registro de neve em dezenas de cidades. Assim deve ser o inverno dos gaúchos em razão de um velho conhecido: o fenômeno El Niño.
O aquecimento das águas do Oceano Pacífico, que provoca chuvas acima da média no sul do país, começa a agir próximo à segunda metade da estação, mas provoca alterações na atmosfera logo no início da semana que vem. É ele também que irá segurar as temperaturas.
- A chuva deve ficar estacionada em algumas áreas da região Sul, e isso impede o avanço de massa de ar polar. Por isso a estação não vai ser tão fria - comenta a meteorologista Olívia Nunes, da Somar Meteorologia. - Vamos ter ondas de frio, sim, mas a persistência da chuva cria uma condição menos favorável para a queda nos termômetros.
É bom aproveitar o tempo seco, que deve permanecer até domingo. Depois, começa a chover no Oeste e a instabilidade se espalha especialmente pela região Noroeste e permanece assim até a próxima quarta-feira.
Esse ciclo se repetirá até meados de agosto, quando finalmente o frio deve passar a ser mais intenso. Hoje, ainda há chance de geada na Campanha e na Serra, onde a mínima chega a -1ºC em São José dos Ausentes.
Muita chuva, mas menos estragos
Apesar das previsões iniciais de que o El Niño este ano poderia atingir o Estado com a força que teve em 1997 - quando provocou enchentes e estragos recordes -, as chuvas devem ser mais frequentes e menos intensas.
- O El Niño deverá se configurar somente no final da estação, fazendo deste ano um inverno dentro da característica. Não há previsão de que seja tão rigoroso quanto no ano passado. A influência maior é entre a primavera e o verão - alerta o meteorologista Leandro Puchalski, da Central RBS de Meteorologia.
Os agricultores, principalmente do centro e do norte do Estado, devem se preparar para chuvas persistentes com a aproximação do final do inverno. A umidade pode prejudicar o plantio de arroz e a colheita do trigo em setembro, segundo Glauco Freitas, da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária. Os meteorologistas alertam, porém, que não há expectativa de frio tardio: o clima gelado deve se concentrar nos últimos meses da estação e não se espalhar para a primavera.
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