
Concentrada na técnica de pintura que acabava de aprender com o artista Dim, dando forma a uma borboleta vermelha sob o céu azul, a pequena Julia, de cinco anos, exultou:
- Esse é o dia mais feliz da minha vida!
Ontem, ela e seus 20 colegas de turma, todos entre cinco e seis anos, realizaram o sonho de conhecer o pintor que, desde maio, os inspirou a criar, brincar e, é claro, pintar. A inserção da arte no cotidiano das crianças, como é realizado no Projeto Pintores, da Escolinha Caracol, em Porto Alegre, é um elemento valioso para estimular as crianças a se expressar.
A cada ano, o projeto elege um artista para apresentar aos pequenos e, diariamente, estimulá-los a desenvolver suas próprias criações inspiradas nas obras originais. Por meio das experiências de criação nas linguagens artísticas, deixam a imaginação voar e, utilizando cores, toques e formas, aprendem e se divertem.
- Com as linguagens artísticas, a criança explora sua imaginação, expressa sua interpretação do mundo, suas fantasias, seus medos, e cria formas surpreendentes a partir da junção de diferentes elementos - explica a artista plástica Analice Dutra Pillar, professora da Faculdade de Educação da UFRGS.
Na turma da Julia, além do estímulo à criativadade, os pequenos aprenderam sobre as técnicas, a cultura e a geografia da região de onde vem o pintor, o Nordeste. Ao final de quatro meses, conheceram o artista ao vivo e apresentaram seus trabalhos a ele.
Na tarde desta terça-feira, após o alvoroço inicial de conhecer Dim ao vivo, o silêncio tomou conta da sala de aula. Enquanto o artista mostrava em um telão suas obras e contava para os pequenos um pouco sobre elas, a concentração era evidente nos olhos de cada um. Dim só era interrompido quando apareciam as imagens de seu ateliê e a turma exclamava:
- Nosssaa!!
Atividade lúdica atrai os pequenos
Antonio Jader Pereira dos Santos, o Dim, como gosta de ser chamado, é um cearense de 45 anos que há mais de uma década expõe suas obras Brasil afora e já contou com um carro alegórico na Sapucaí em homenagem a sua arte. Nesta semana, veio diretamente da pequena cidade de Pindoretama, no Ceará, onde mora e cuida do Museu BrinqueDim, para conhecer a turma de Julia. Com traços grossos e cores fortes, seu lema é transformar a arte em brinquedo e o brinquedo em arte.
- Virei artista aos três anos, quando comecei a criar meus brinquedos. Desde lá, nunca mais parei. O que vemos nas criações dessas crianças é a forma que elas encontram para resolver as fantasias delas, e isso é muito especial - conta o artista.
E é exatamente a possibilidade de utilizar a arte como brincadeira o que mais atrai os pequenos. Mesmo sem se dar conta, a cada pincelada, a cada peça montada, realizam aquilo que é a infância.
- A criação nas linguagens artísticas está relacionada ao brincar, à ludicidade, pois a exploração dos materiais e das linguagens é uma atividade prazerosa que envolve o corpo todo e os pensamentos - resume Analice.
Dim entende bem disso. Lembra que, por meio de seu primeiro brinquedo (um pedaço de madeira com um furo no meio que, com a ajuda de um empurrão,
movia-se uns 10 centímetros), deu sua primeira volta ao mundo. Julia e sua turma também passearam por esse e outros mundos inspirados pelo artista cearense.
- Fizemos as nossas obras inspiradas no Dim, que usa muito as cores primatas - disparou a pequena Ana Alice Leal, de seis anos, ou Bibi, como é chamada pelos colegas. Na mesma hora, é corrigida pela professora Adriana Verardi, a Drica:
- Primatas não, primárias, Bibi.
- Isso, as cores primárias, que são o vermelho, o amarelo e o azul - disse a menina.
Enquanto mostra as criações para o artista, contou que o colega Marcos foi o eleito para fazer o gesso dos bonecos. E ele logo explicou o motivo:
- A "sora" disse que eu tinha o talento nas mãos. Acho que ficou bem legal, né?
O sorriso no rosto de Dim respondeu prontamente a pergunta.