"Às 7h50min de ontem, o Gasômetro estava diferente. A antiga usina parou. Agora o prédio vai ser demolido para a cidade crescer ainda mais". Publicado com destaque na capa de ZH em 13 de agosto de 1974, o texto acima anunciava o que parecia ser um fato consumado: o edifício seria posto abaixo, porque estava no caminho traçado para a Primeira Perimetral. Apenas a chaminé seria conservada.
Por pouco, esse desastre não se realizou, privando Porto Alegre de um de seus símbolos. Ele foi só evitado porque moradores, intelectuais e artistas se mobilizaram, em plena ditadura. O esforço foi coroado, em 1982, com o tombamento do prédio pelo município.
Uma das pessoas que ajudaram a salvar o Gasômetro foi a artista plástica Zoravia Bettiol, que no começo dos anos 80 presidia o recém-criado Movimento Gaúcho em Defesa da Cultura, formado por pessoas de 11 diferentes setores. Zoravia conta que o grupo elaborou manifestos, preparou uma carta aberta ao então governador Amaral de Souza, enviou pelo correios cartões pedindo apoio à população e procurou jornais e emissoras de TV.
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Almanaque Gaúcho: há 40 anos, Usina do Gasômetro era desativada
Em 1974, o valor no prédio era o metal dos equipamentos que sobraram
- A gente foi berrar nos jornais. Toda a opinião pública ficou a nosso favor. A pressão era tão grande, que seria escandaloso demolirem a usina - relata.
Também fundadora e integrante do movimento, a arquiteta e artista Liana Timm recorda de audiências com representantes do poder público e de passeata pelo Centro.
- Nós infernizamos as autoridades. Para eles, a usina era um elefante branco - conta.
Na época em que foi salva, a Usina do Gasômetro era um prédio em ruínas. As vidraças estavam quebradas, o telhado desaparecera, o reboco caíra e as paredes apresentavam rombos. O interior, alvo de saques, estava tomado de sujeira e entulho.
Na época em que os artistas e integrantes de associações de moradores enxergavam no imóvel um tesouro, outros encaravam-no apenas como estorvo. O vereador Jorge Goularte propôs a implosão do edifício na Câmara:
- É a solução mais barata. Aquele pardieiro só serve para juntar ratos.
Leandro Valiati, professor de economia da cultura da UFRGS, afirma que a Usina ganhou, pela relevância simbólica, um valor que transcende a sua utilidade como prédio e que não seria alcançado por outra edificação no lugar:
- A ideia de progresso, no passado, era derrubar patrimônio histórico e levantar edifícios modernos. Houve uma mudança. O Centro tem hoje um corredor com prédios históricos com funções contemporâneas: a Casa de Cultura Mario Quintana era um hotel, o Margs era a delegacia fiscal, o Santander Cultural era um banco e a Usina gerava energia. Esses prédios fazem a conexão do passado com o presente, o que é importante da perspectiva do valor econômico, e sinalizam a forma como podemos ocupar o centro das nossas cidades.
