
Assistindo à filha desfilar em uma passarela pela primeira vez, a costureira Marli Rodrigues da Silva, 40 anos, exibia um sorriso tão largo que por vezes contrastava com as insistentes lágrimas que brotavam de seus olhos. O motivo de tamanha emoção não era somente o sucesso que a pequena Vitória, cinco anos, fazia ao subir no palco durante a manhã desta segunda-feira. É que, desde maio deste ano, quando começou a perder o cabelo devido a um tratamento de leucemia, a pequena não emanava tamanha felicidade.
- Minha filha teve períodos de muita tristeza. Ela chorou tanto quando o cabelo começou a cair por causa do tratamento. É muito emocionante vê-la passeando com essas madeixas que foram feitas especialmente para ela - contou a mãe.
Saiba como participar da ação e doar seus cabelos
Com Vitória, outras quatro pacientes do Hospital Santo Antônio, do Complexo Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, atravessaram a passarela para exibir as perucas recém entregues a elas. Este foi o primeiro fruto da ação Força na Peruca, iniciada em agosto, onde 80 funcionárias da instituição e seus familiares cortaram seus cabelos para doar às crianças. Na ocasião, 171 mechas foram arrecadadas, mas os números se multiplicaram rapidamente. Em menos de dois meses, o posto de coleta de cabelo do hospital arrecadou 1,1 mil madeixas, oriundas de diversas cidades do Estado. Elas enfeitarão, assim que terminarem de ser confeccionadas, as cabeças de centenas de pacientes em tratamento.
Durante o evento, não foram somente as pequenas pacientes que desfrutaram os momentos de fama. Elas dividiram a passarela com outras três crianças, que não estão internadas, convidadas a participar do evento:
- A intenção de juntá-las foi fazer com que as pacientes não se sintam diferentes. Elas desfilam com outras meninas, filhas de funcionários da instituição, que não estão em tratamento. E, pelo que vemos aqui, está dando certo - comemomorou Juliana Martini, voluntária da ONG Cabelaço, que colaborou com o evento junto com a ONG Doutorzinhos.
Para Vitória, que descreveu a experiência como "legalzona", o novo cabelo a deu, além dos minutos de fama, uma distração à dura realidade de quem luta contra o câncer:
- Há dias ela só fala nisso. É otimo ver minha sobrinha animada e feliz. Isso nos dá mais força pra seguir adiante - contou Miriam Rodrigues da Silva, tia da paciente.
"Acho que nunca a vi sorrindo tanto"
Com uma plateia bastante diversificada, que contou com pacientes, funcionários, familiares e curiosos, a animação foi a palavra de ordem. Depois do desfile, uma banda convidou todos a dançar ao ritmo de canções famosas. Entre as que sacudiram o corpo do início ao fim estava Ingrid Vitória Dias Ignacio, 10 anos. A menina, diagnosticada com leucemia em 25 de dezembro do ano passado, desde fevereiro tentava se acostumar com a falta de madeixas na cabeça. Durante os últimos meses, teve também de atravessar períodos de melhora e outros mais críticos - a menina ficou um período em coma, apresentou dificuldade para caminhar e passou por momentos em que não conseguia falar. Para a mãe, Flavia Rubiana Dias, 32 anos, tudo isso está ficando no passado:
- Fazia seis meses que minha filha não sentia os cabelos no rosto. Ela está muito feliz. Acho que nunca a vi sorrindo tanto. Ela está melhorando e essa alegria toda ajuda muito - emocionou-se.
Quem também não conteve as lágrimas foram os doadores de cabelo que participaram da ação em agosto. Ansiosos, acompanharam o desfile para ver o resultado de sua doação. Maria José Kulmann, 44 anos, é funcionária do hospital e foi uma das primeiras a se motivar com a ação. Depois de se desfazer de 20 centrímetros do cabelo, sentiu a recompensa de ver suas madeixas alegrando as meninas:
- Criança nunca deixa de sorrir, por mais dificil que seja a situação. Mas, nessas horas, o sorriso tem ainda mais força, e é muito gratificante contribuir de alguma forma.