Barry Al-Fayeed é um pediatra na Califórnia, onde vive com a mulher, Molly, e os dois filhos adolescentes. Na vida anterior, ele se chamava Bassan e era filho do ditador de um país fictício que ninguém sabe qual é, mas pode ser Iraque, Iêmen, Síria ou qualquer outra das tranqueiras políticas da região.
Nossa série, Tyrant, começa no momento em que Barry e família feliz se preparam para retornar ao país que ele tenta esquecer e a família não conhece. Um sobrinho de Barry está se casando, a festa vai ser de arromba, e eles decidem ir até lá para Barry poder remexer seu passado e quem sabe curar um pouco da dor que o consome. Claro que chegar é uma coisa, cair fora é outra.
Os passados, especialmente os mais sombrios, são um chiclete, e Barry, agora Bassan, vê-se enredado, capturado, impedido pelas circunstâncias de fazer o que mais gostaria: voltar à sua ensolarada e entediante Califórnia.
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A série serve para nos mostrar algumas coisas importantes na Realpolitik: opressores estão lá para oprimir, mas eles também servem para reprimir forças que podem ser mais terríveis do que as que eles mesmos representam. Remover ditadores não chega a ser tão difícil.
Mas o que prolifera no vácuo que eles deixam pode ser ainda pior do que o que havia sob a bota do ditador de plantão. Temos uma família assustadora, um país assustador, um ditador assustador e um primogênito que frequentou a Escola Hogwarts das Artes do Mal. Cenas de arrepiar não faltam.
Os americanos gostam de ver como o mundo lá fora pode ser bárbaro e assustador, mais até mesmo do que o Texas. Tyrant serve bem a esse fim. Barry quer ser Barry e esquecer que é Bassan.
O que vemos na série é a demonstração de que americanizar o nome é fácil, mas ninguém escapa do sobrenome. Barry Al-Fayeed tenta, mas, como Al Pacino em O Poderoso Chefão, ele vê que querer é uma coisa e poder é outra. E descobre, agora que cometeu o erro de voltar, que ele não pode, talvez nunca mais possa, querer coisa alguma que não ser o que nunca quis. Ele é mesmo o filho de um tirano, e disso, caros amigos, escapar não há quem possa.
Coluna
Marcelo Carneiro da Cunha: "remover ditadores não chega a ser tão difícil"
O colunista escreve semanalmente no 2º Caderno
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