
Bem-humorado, o diretor Gil Vicente Tavares admite que sentiu um frio na barriga quando foi lembrado pelo repórter que a peça Quarteto, do dramaturgo alemão Heiner Müller (1929 - 1995), havia sido apresentada no Porto Alegre Em Cena de 2009 pelas mãos de Robert Wilson, um dos maiores encenadores do mundo, com a estrela francesa Isabelle Huppert. Para Tavares, talvez isso ajude a explicar o fato de terem se esgotado os ingressos da montagem que ele e a companhia baiana Teatro NU estreiam nesta sexta (12/8), com sessões também no sábado (13/8) e no domingo (14/8), sempre às 18h, na Sala Carlos Carvalho da Casa de Cultura Mario Quintana.
- Com certeza o espetáculo do Bob Wilson vai estar na memória do público. Muitos devem estar pensando: "Vamos ver o que esses baianos tiveram a ousadia de fazer". Mas quem está na chuva é pra se molhar - diz o encenador.
Esta é a segunda vez que Tavares encena o texto de Heiner Müller, celebrando 15 anos de direção teatral. A primeira foi em 1999, em seu espetáculo de graduação na faculdade, contando com o ator sergipano Harildo Déda, um dos nomes mais prestigiados na cena baiana. A produção valeu a Tavares o Prêmio Copene (hoje Braskem) de revelação.
Já o novo Quarteto é um trabalho de maturidade. A maquiagem branca que os atores ostentavam na versão de 15 anos atrás deu lugar a uma caracterização em um tom amarelado descascado, como se tivesse sofrido a ação do tempo. O personagem masculino e a personagem feminina que trocavam memórias de jogos de sedução deram lugar a dois personagens masculinos - ou melhor, andróginos - interpretados por Marcelo Praddo e Bertrand Duarte. Curiosidade: Duarte estava há 28 anos distante dos palcos, envolvido com projetos na TV e no cinema.
A dramaturgia é baseada no romance psicológico As Ligações Perigosas, do escritor francês Choderlos de Laclos (1741 - 1803), que foi adaptado para o cinema em 1988 pelo diretor Stephen Frears, com Glenn Close, John Malkovich e Michelle
Pfeiffer. Em sua releitura da trama, Heiner Müller toma o fio condutor para tratar de questões políticas e sociais, conforme Tavares:
- A peça tem humor, é leve, fala de sexo, conquista e sedução. Mas, durante o tempo todo, tem o peso dessa coisa mais densa, profunda, que fala da nossa sociedade.
Conhecido pela adaptação do romance Sargento Getúlio, de João Ubaldo Ribeiro, que esteve no Em Cena de 2012 e no Palco Giratório deste ano, o Teatro NU chega em dupla com a produção também baiana A Caixa Não É de Pandora, que ainda tem sessões nesta quinta (11/8) e sexta (12/8), às 19h, no Teatro Sesc Centro.
- Temos que fortalecer o eixo Porto Alegre-Salvador - defende Tavares. - São duas cidades com energias muito parecidas. Cheguei ao Mercado Público e vi lojinhas vendendo artigos de candomblé.