
A Cia. Deborah Colker vem se apresentando há 21 anos, sempre com um padrão de qualidade inquestionável. Os bailarinos são de alta qualidade técnica e a equipe é de alto nível, incluindo sempre os belos cenários de Gringo Cardia e a luz eficiente de Jorginho de Carvalho, aliados a belos figurinos.
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Por muito tempo, Deborah Colker foi sinônimo de uma dança que flertava com o risco, prendendo magistralmente a atenção do público espectador, seja com uma roda gigante de bailarinos pendurados, uma parede de alpinismo escalada pelos mesmos ou nós de cordas. Aos poucos vai surgindo o ballet como técnica e uma narrativa por trás dos modos da dança clássica de repertório.
Em Belle, reafirmando a narrativa como opção, Deborah traz a dramaturgia de Joseph Kessel (1928) celebrizada por Luis Buñuel (1967), contando a história de uma dona de casa que passa as tardes num bordel para fugir da rotina burguesa. Deborah começa o espetáculo didaticamente projetando o roteiro e mostrando duas Belles, uma loira e uma morena, representando as duas faces da personagem. O casal, na banalidade de seu dia a dia, vai sendo invadido pelos delírios eróticos da entediada esposa. Transformada, ela surge enrolada num pano de belo efeito interpretada por uma bailarina excepcional, que contracena com um símbolo erótico masculino de máscara branca em cena que termina no ponto alto do espetáculo, onde as características espetaculares de Deborah ressurgem, num grande ato sexual onde uma cortina simboliza a membrana que separa o ser social do sexual e que literalmente engole a bailarina, enquanto homens de cuecas com enormes sexos artificiais a seduzem.
Descendo a escada para o submundo, o segundo ato se passa no bordel, e além de ser praticamente desnecessário e sem sutileza alguma, se transforma referencialmente num show do Crazy Horse ou num clipe de Lady Gaga.
Onde a obra de 1967 chocava o público, estas coreografias não conseguem o mesmo impacto, não apenas pela obviedade, mas por serem hoje totalmente habituais aos clipes televisivos.
Certamente, Deborah agrada as massas, entretém, mas falta instigá-las, questioná-las. Ótimo acabamento, espetacularidade, um elenco de primeira.
*Eva Schul é coreógrafa