
Os tapumes de locais em obras são tão presentes na produção de André Venzon que acabaram se fundindo ao seu corpo. Essa simbiose do artista com seu objeto está aos olhos de quem passar pela Rua dos Andradas, no trecho da Praça da Alfândega, onde foram colados, nos tapumes do antigo Cinema Imperial, cartazes com imagens do rosto dele recoberto pela textura da madeira rosada.
A ação, que serve de divulgação para a Pois Eu Estou em Sua Memória, mostra que será aberta neste sábado (11/10), às 19h, na Galeria Península, é mais um dos projetos em que Venzon se dedica a explorar o modo como percebemos as paisagens urbanas - em suas mutações físicas e seus relevos sociais. Há mais de 10 anos, ele tem feito do madeirite de cor fúcsia (ou magenta) um elemento insistente e até obsessivo em suas obras. Aparece constantemente, de diferentes formas, em trabalhos diversos, desde fotografias e objetos, até instalações e intervenções nas ruas.
Na cidade, os tapumes sinalizam aos pedestres locais em reforma ou construção. E dão esse aviso escondendo do lado de trás algo que deixará de estar ali para dar lugar a outra coisa. Perceber essa espécie de imposição visual, que transforma rotineiramente a relação das pessoas com o seu lugar, oferece uma chave de entrada para o trabalho de Venzon.
- A perda não é só dos lugares e dos objetos que contam a história, seja das casas, das famílias ou das cidades. A perda é das pessoas - diz o artista.
Essa privação a que o olhar é submetido fica evidente na exposição, onde Venzon apresenta algumas de suas séries. Fechamento traz cenas urbanas de ruas e prédios circundados por tapumes. São fotografias que funcionam como registros de momentos intermediários das transformações desses locais. Por serem transitórias, são também efêmeras.
Cidade sem Faces, uma das séries mais lembradas do artista, reúne imagens de pessoas anônimas com as cabeças dentro de caixas de madeirite, fotografadas individualmente em situações de proximidade a algum motivo arquitetônico. Em Corpo Tapume, fotos simulam a fusão do corpo com a madeira rosa. Entre as outras séries, há trabalhos mais recentes, como Por que Sempre Queremos Ver Arte?, em que o artista cria assemblages (objetos com diferentes materiais e linguagens), fazendo intervenções em porcelanas, tapeçarias, bibelôs e brinquedos. Em praticamente todas as séries, há algum elemento que faz referência ao tapume.
- Hoje percebo que as séries se conectam, o que não foi pensado inicialmente, mas aconteceu. Minha relação com o tapume chega até a fusão com o corpo, com a pele que vira tapume, que assim vira pele da cidade - diz.
Talvez mais do que pele, Venzon proponha que os tapumes encravados nas cidades funcionem como uma moldura do olhar para pensar as separações entre os transeuntes e o entorno urbano. Nesse sentido, faz deles um dispositivo conceitual com o qual opera visualmente tensões simbólicas entre memória, território, pertencimento e coletividade.
- Se as pessoas são lugares, um lugar é onde tem uma pessoa. Por isso, a pergunta: qual é o teu lugar? Esse lugar é físico, mas também de identidade.
Diretor do Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul (MACRS), Venzon tem 15 anos de carreira e não apresentava uma exposição solo desde Boates, de 2006, no Margs. Pois Eu Estou em Sua Memória é a primeira individual da Península, que, desde sua abertura em maio, tem funcionado não só como galeria, mas como mais um espaço com programação cultural no Centro Histórico de Porto Alegre.
Pois Eu Estou em Sua Memória
> Abertura neste sábado (11/10), às 19h. Visitação de terças a sextas-feiras, das 14h às 18h, e sábados, das 15h às 18h30min. A mostra segue em cartaz até 6 de novembro. Gratuito.
> Galeria Península (Andradas, 351), em Porto Alegre.
> A exposição: André Venzon apresenta uma amostra da produção realizada nos últimos 15 anos. Entre os trabalhos, há fotografias, assemblages, objetos e instalações, destacando o uso do tapume como elemento de trabalhos que compõem diferentes séries.