
Mikkel Keldorf, jornalista dinamarquês que deixou o país antes da Copa do Mundo dizendo-se desiludido com a forma com que a preparação era conduzida, e Carla Tauden, cineasta brasileira que vive em Los Angeles e criticou o evento, afirmando que não viria ao Mundial, reconhecem que tudo correu sem incidentes de destaque durante o mês de jogos e festa no Brasil. Tanto Keldorf quanto Carla, entretanto, argumentam que o motivo de seus questionamentos era outro.
Os dois personagens, até então desconhecidos, ganharam notoriedade com mensagens de protesto contra o Mundial no auge dos questionamentos à organização da competição. Mesmo diante dos elogios ao Brasil após o evento, a dupla de críticos agora célebres mantém o posicionamento. Ambos garantem que não previam um caos de infraestrutura capaz de fazer o país passar vergonha. A suposta violação de direitos humanos e o investimento na construção de estádios, enquanto há problemas em setores como saúde e educação, foram as principais questões levantadas.
Carla Tauden, em seu vídeo Eu não vou para a Copa do Mundo.
- Não me surpreendi que tudo funcionou bem, nem com a receptividade do povo brasileiro, que é maravilhosa. Nunca duvidei que o Brasil poderia fazer uma grande Copa. Questionei, desde o início, se era necessário fazer a Copa com os problemas que temos - diz Tauden, que esteve no país durante o Mundial, o que resultou em críticas pela suposta contradição de publicar um vídeo afirmando que não viria e depois desembarcar no Brasil:
- Eu não vim para a Copa, não fui aos jogos nem vim para aproveitar o evento. Estava aqui para filmar um documentário, para mostrar alguns dos pontos que critiquei.
A ideia do vídeo original de Tauden, que tem mais de 4 milhões de visualizações no Youtube, surgiu como sátira da visão que os estrangeiros têm do Brasil. Nos Estados Unidos, ao revelar sua nacionalidade, Carla era imediatamente questionada sobre a empolgação com a Copa. Percebia que no Exterior não se sabia da contestação que a organização do evento sofria.
Na esteira da repercussão de sua mensagem, veio o uso para disseminar ideias com as quais não concordava. Ao ver sua fala compartilhada na página Golpe Militar 2014, no Facebook, deu "um pulo da cadeira". Resolveu publicar um texto em que esclarece suas posições.
- Meu problema não é com um partido ou outro. Os governos estaduais também participaram da organização da Copa. O uso político do evento foi muito grande, pela situação e a oposição - lamenta.
O turbilhão causado pelo vídeo fez com que se aprofundasse no tema e tivesse a ideia do documentário. No Brasil, foi convidada pelo jornal inglês The Guardian a fazer um balanço da Copa, no qual bate forte nas remoções forçadas de famílias para obras do evento. As violações de direitos humanos também aparecem em outro documentário, este de autoria de Keldorf. Quando deixou o Brasil, em abril, o dinamarquês já tinha imagens e entrevistas suficientes para montar O Preço da Copa do Mundo, filme publicado em seu site.
Keldorf toca em temas delicados como a forma com que os moradores de rua foram tratados durante a preparação para a Copa. Um de seus entrevistados relata casos de homicídio de crianças de rua em Fortaleza. A Secretaria de Segurança Pública do Ceará, porém, destaca que não há registro desse tipo de incidente na capital do Estado. Mesmo assim, o jornalista mantém a postura crítica.
- A Copa passou sem escândalos. Tudo foi feito antes do evento. Na Olimpíada de Pequim, em 2008, aconteceu algo parecido e os turistas nem perceberam enquanto estavam lá. É até assustador pensar que esse tipo de estratégia funciona - destaca.
* ZH Esportes