
Individualismo, autoexclusão, repressão sexual, autocobrança. Vários fatores, por vezes contraditórios, podem estar por trás da decisão coletiva de dar fim à vida, supostamente tomada por um grupo de jovens e adolescentes na Serra.
Uma investigação profunda poderá desvendar quais dessas manifestações se mesclaram à atitude dos jovens, mas via de regra elas estão presentes, em maior ou menor grau, nos suicidas. Quem comenta é a cientista social Rosângela Werlang, doutora em Psicologia Social e uma das maiores especialistas gaúchas em estudo de suicídios.
Apesar de lidar com o assunto há quase duas décadas, Rosângela está surpresa com a provável combinação armada pelo grupo para se matar - uma atitude incomum no Brasil. Suicídios costumam ser atos individuais de desespero. Há exceções, como em 1978, quando 918 pessoas se suicidaram em uma cerimônia conduzida pelo pastor Jim Jones, na Guiana. O "objetivo" era chegar a um pretenso paraíso celestial.
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Determinadas comunidades ou profissões, como grupos de pequenos agricultores no Rio Grande do Sul, são mais vulneráveis a fatores que podem levar ao suicídio, como alcoolismo e endividamentos. Não seria o caso dos jovens em Canela e Gramado.
O fato de quase todos estarem na adolescência, um período de explosão da sexualidade, pode ter contribuído. Adolescentes são ambíguos, destaca Rosângela, porque cultivam o individualismo, mas agem conforme o grupo a que estão vinculados.
- É muito comum que adolescentes tenham sua sexualidade castrada em um ambiente e sejam pressionados a se liberar em outro. Um conflito que pode resultar em baixa estima, autoexclusão e autocobrança - afirma a especialista.
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Rosângela lembra que o sociólogo francês Emile Durkheim classificou os suicídios em três categorias: egoísta (no qual a falta de laços sociais leva ao desejo de morte), altruísta (quando o sujeito se sacrifica por uma causa) e anômico (quando a vida do suicida é atingida por bruscas e negativas mudanças sociais).
- Ninguém dá conta de si, ninguém é uma ilha. Pode acontecer uma contradição entre o que o grupo social ou família prezam e entre o que meu eu mais profundo deseja. E ocorrer um rompimento violento. Mas só a investigação definirá qual desses tipos se enquadra nesse pacto trágico - sintetiza Rosângela.
* Zero Hora