A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou, nesta quarta-feira, apelação no qual o economista e professor Gabriel Afonso Marchesi Lopes pedia indenização a dois colegas por terem chamado ele de neonazista. O ressarcimento por dano moral já tinha sido negado, em primeira instância, pela juíza federal Paula Beck Bohn.
Marchesi Lopes pedia indenização em vista de menção feita a ele no livro "História Centenária da Faculdade de Ciências Econômicas 1909-2009". Na obra, os professores Ronaldo Herrlein Junior (autor de artigo) e Gentil Corazza (organizador do livro) chamam Marchesi Lopes de militante neonazista. Anexam, como prova, um e-mail que teria sido enviado por Marchesi Lopes, quando era aluno da UFRGS, no qual se refere a judeus como "execráveis" e diz que os Nacionais-Socialistas estão sob ataque semita. Trecho do e-mail:
- Realmente, em um primeiro momento, não sei como barrar essa onda de ataques semitas aos movimentos NS. Posteriormente, caso eu consiga obter o cargo que estou pleiteando, sei que poderei dar um apoio concreto aos NS de Porto Alegre, pois me será disponibilizado uma gama de recursos (espaço físico, apoio logístico, fontes de mídia e, inclusive capital).
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Em 2005, Marchesi Lopes foi suspenso por 60 dias, após comissão disciplinar da UFRGS condenar seu posicionamento. O processo judicial ressalta que, em entrevistas concedidas na época, Marchesi Lopes admitiu ser autor da mensagem, mas negou ser neonazista. Ele alega ter sido prejudicado nos estudos pela menção feita a ele no livro.
Na defesa dos dois professores acusados, Ronaldo Herrlein Junior e Gentil Corazza, o advogado Ricardo Cunha Martins alegou o direito constitucional à livre manifestação de pensamento e argumentou que o fato narrado no livro é verdadeiro, baseado em documentos da própria UFRGS. A juíza Paula Bohn e, agora, o TRF, acataram os argumentos dos réus e negaram direito à indenização a Marchesi Lopes. Na esfera criminal, também foi negado pedido dele para que os autores do artigo no livro fossem condenados por difamação.
- Penso que a decisão do Tribunal é importante para reafirmar não só o direito à informação dos fatos históricos, mas também no campo dos direitos humanos, sendo incompatível numa sociedade democrática e de direito a indenização por crítica ao nazismo - resume Ricardo Cunha Martins.
O que diz o professor
No final de março de 2015, o professor Gabriel Afonso Marchesi enviou a seguinte manifestação sobre a decisão da Justiça:
"O processo que movi, em razão da vexatória e humilhante exposição que sofri em meu ambiente de trabalho e convívio, e que me causou grande abalo físico e emocional, teve por base direitos constitucionais que me são assegurados como cidadão brasileiro, sobretudo no que tange a inviolabilidade de minha intimidade, vida privada, honra e imagem.
Negando meus direitos à personalidade e privacidade, a Juíza Paula Beck Bohn julgou improcedente minha demanda por entender que à estes direitos sobrepuja-se o direito à liberdade de expressão, muito embora esta liberdade tenha sido exercida através da divulgação de informações falsas a meu respeito, reconhecidas e justificadas pela Magistrada como "Os réus não tinham a obrigação de, antes de publicar o livro, apurar novamente os fatos" e "aquele que publica relato histórico não está obrigado a apurar e investigar, um a um, os fatos relatados".
Os tais fatos relatados são i) que eu havia perdido o semestre em razão de suspensão de 60 dias, quando não fui suspenso por um dia sequer, ii) que renunciei à minha candidatura, quando tal renúncia jamais se concretizou e iii) que sou militante neonazista, quando também não sou e nunca o fui.
No Tribunal de Justiça, o processo levou mais de um ano para ser julgado e quando foi, para minha surpresa, verifiquei que o relator, Desembargador Fernando Quadros da Silva, limitou-se a um simples procedimento de cópia e colagem da sentença do primeiro grau, votando no sentido de negar provimento à apelação sob a justificativa de que "Observa-se que, em que pese a publicação do livro, o mesmo não foi distribuído a toda e qualquer pessoa que o quisesse adquirir, ficou restrito à própria universidade, não tendo o apelante sofrido qualquer vexame, humilhação ou dano à sua imagem profissional perante a sociedade pelos fatos narrados".
Ou seja, o Desembargador entendeu que quem é chamado de militante neonazista não sofre qualquer vexame e humilhação. Mais que isso: entendeu também que não houve nenhum abalado à minha imagem profissional, pois a publicação foi restrita à Universidade, muito embora meu ambiente profissional, de trabalho e convívio, seja a Universidade, onde fui estudante de Graduação e Pós-Graduação, Docente e Conselheiro em diversos órgãos colegiados da Universidade, com a qual tenho vínculo até hoje.
Enfim, diante de toda injustiça e humilhação que sofri e ainda sofro, optei por não recorrer ao terceiro grau, a fim de não perder mais tempo e dinheiro, passando por ainda mais desgastes físicos e emocionais, porém crente no fato de que, tendo um Poder Judiciário como este, o país realmente chegou ao fundo do poço".