Primeiros passos
Começar a reduzir o impacto no ambiente demanda apenas conscientização. Práticas simples podem diminuir a sua pegada ecológica. O incentivo aos bons hábitos e o sinal de alerta para os ruins pode partir de cada um - mais do que de iniciativas do governo ou até mesmo de empresas. Ambientalistas apontam que alguns fatores determinantes para a marca são alheios à ação individual, mas há muito espaço para mudança.

Ao caminhar por um terreno delicado, deixamos marcas. É assim na areia, na grama, até no barro e na lama. Cada passo fica ali, símbolo do impacto causado pela nossa passagem. É assim também com a Terra.
Aquele produto novo, a última refeição consumida, a escolha de onde morar e como se locomover, o tempo no banho e o gasto de energia: tudo causa um impacto no ambiente. Em maior ou menor grau, isso indica se uma pessoa vive de maneira compatível com a capacidade natural de regeneração do planeta. É a chamada pegada ecológica, que mede o impacto de cada um nos recursos naturais.
O diferencial desse índice está no apelo individual. Cada pessoa pode, através de um questionário simples, saber o quanto consome, em média, dos recursos naturais do planeta. O resultado é acessível: nada de quantidade de gases emitidos ou créditos de carbono necessários - cálculos muito importantes, mas pouco tangíveis. Sua pegada ecológica é determinada em hectares, uma forma de traduzir qual o tamanho do território que uma pessoa utiliza para se sustentar.
- Temos de nos conscientizar sobre o impacto causado na natureza com o nosso padrão de consumo. Atualmente, temos consumido mais do que a natureza pode prover. Com a pegada ecológica, cada um pode determinar seu impacto no cotidiano e pensar em formas mais sustentáveis de viver no planeta - avalia a bióloga Terezinha Martins, analista de conservação do WWF-Brasil.
Calcular esse rastro ambiental é uma tarefa que engloba, principalmente, os hábitos de consumo. Quem não dispensa uma porção de carne vermelha por dia (ou mais!) exige recursos naturais em demasia, assim como quem prefere percorrer distâncias curtas de carro. Tomar banhos demorados, deixar luzes ligadas enquanto o Sol brilha lá fora, colocar todo lixo no mesmo saco: tudo isso contribui para aumentar seu impacto no mundo.
E mudar hábitos que prejudicam o mundo passa, primeiro, por entender que algumas atitudes, mesmo aquelas que não parecem ter muito impacto no ambiente, podem afetar o mundo como o conhecemos. Um modo de vida mais sustentável implica em exigir menos da natureza - garantindo, assim, uma pegada mais leve. Não é o caso de evitar o que uma pessoa já se acostumou a fazer, mas identificar maneiras de contornar o alto consumo de algumas práticas.
- É importante as pessoas perceberem a sua contribuição pessoal na pressão sobre os recursos naturais. O conceito de consumo sustentável é uma utopia: a solução está em as pessoas perceberem os cenários e desafios e, a partir daí, vislumbrar as contribuições pessoais que podem fazer no dia a dia para sair dessa rota de colisão com a insustentabilidade - adverte Genebaldo Freire Dias, PhD em ecologia e funcionário aposentado do Ibama.
Ter consciência do próprio efeito sobre o ambiente tende a fazer a diferença: ainda que alguns hábitos nunca mudem, repensar as atitudes individuais leva cada um a entender melhor como contribuir para o futuro - e o presente - do planeta.
Sabendo o quanto consome de recursos naturais disponíveis no planeta, fica mais fácil tomar decisões para um consumo mais responsável da água, do solo, dos minerais contidos em produtos eletrônicos, como smartphones e computadores. Se a pegada for muito elevada, o consumo é incompatível com a capacidade natural de regeneração do planeta, e a pessoa tem um estilo de vida que compromete o futuro dela mesma e das próximas gerações
Fabiano Scarpa, pesquisador do programa internacional Global Land Project, com sede no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)
- Vivemos em um contexto em que, muitas vezes, não conseguimos ser ecologicamente corretos -, afirma Cristiane Fensterseifer Brodbeck, educadora ambiental e professora da Unisinos. - É difícil deixar o carro de lado sem um transporte público de qualidade, e nossos horários dificilmente permitem uma visita à feira. Mesmo assim, é preciso refletir, porque não há uma solução mágica para as questões ambientais: a mudança começa por cada um.
Há, porém, quem acredite que modificar práticas insustentáveis não é mais questão de escolha, mas uma necessidade. Para o PhD em ecologia Genebaldo Freire Dias, a mudança de hábitos passou a ser uma estratégia de sobrevivência - e será exigida da nossa espécie uma mudança muito maior. Ele compara a situação ambiental atual com a de algumas décadas atrás para afirmar que somente apagar a luz, usar menos água, já não funciona mais.
- Hoje é mais difícil do que era há 10 anos, porque as mudanças necessárias são mais drásticas: elas vão incomodar mais do que em décadas passadas. Está se exigindo das pessoas um processo de adaptação muito mais profundo, e não são mudanças de hábitos simples. É preciso nos adaptar, mudar nosso estilo de vida - ressalta o professor.
Afinal, cada passo fica marcado, mas não de maneira indelével: basta uma atitude para suavizar aquele rastro. E sempre há tempo de olhar para trás e avaliar o que foi feito - e assim, se for preciso, mudar o passo seguinte.