* Professor Titular de Antropologia da UFRGS e membro da Academia Brasileira de Ciências. Escreve mensalmente no PrOA.
A imitação faz parte do desenvolvimento humano. Apreendemos algumas das coisas mais importantes da nossa vida, copiando o que os mais velhos fazem. Os filhos, quando pequenos, imitam os gestos dos pais, o que dá imensa alegria a estes. As crianças não precisam ser matriculadas numa escolinha para aprender a caminhar ou falar. Já quando somos adultos as coisas se complicam e aprender uma nova língua é um processo árduo.
Há várias palavras para designar o ato de copiar. Algumas são positivas: emulação, réplica, citação, paráfrase, mimesis. Outras são negativas: imitação, arremedo, falsificação, plágio, cola, fake. A valorização ou desvalorização obviamente depende de qual dos lados nos encontramos. As empresas detentoras de marcas famosas estigmatizam a cópia como falsificação, já os que copiam o produto preferem o termo réplica. Ninguém copia algo que não admira.
No Brasil há o ditado que diz que "quem não cola não sai da escola". Nessa perspectiva, é preciso aprender não só a copiar o que o colega CDF sabe, como é preciso aprender a burlar regras para estar preparado para a vida que é cheia de normas complicadas e às vezes sem sentido. Já em outros países, onde a norma é quase sagrada, há estabelecimentos de ensino com um código de honra muito rígido: basta ser apanhado uma vez colando para ser expulso. Quem nunca tiver colado, que atire a primeira pedra
Com a internet e o sistema Windows ficou mais complexo determinar o que é original e o que é cópia. Existem programas que permitem aos professores verificar se um trabalho foi feito pelo aluno ou se ele foi copiado. Mas o "copiar e colar" se tornou algo que fazemos cotidianamente em nosso computador. Assim, podemos eliminar alguém de uma foto, incluir uma pessoa que não estava originalmente lá, acionar um photoshop para tornar a foto mais bonita, e ninguém acha que isso seja exatamente uma falsificação.
Na primeira década do século 20, quando Charles Chaplin se mudou para os Estados Unidos, ele se tornou uma figura extremamente popular e o tipo "Carlitos" se transformou num ícone. Havia uma infinidade de "Chaplinistas" que ganhavam a vida em circos e teatros imitando seu estilo. Vários concursos, um inclusive nacional, premiavam quem melhor conseguisse imitar o gênio do cinema mudo. Em 1915, estando em San Francisco, Chaplin ficou sabendo de um desses certames e nele se inscreveu. O resultado foi catastrófico e ele não passou da primeira rodada. O júri achou que Chaplin não sabia imitar Carlitos
Ao contrário de Chaplin, o artista americano J.S. Boggs não tem talento para o humor. A sua arte consiste em pintar desenhos de cédulas de diferentes moedas nacionais e estrangeiras. Ele procura trocar essas pinturas por bens e serviços e tem sido bem-sucedido nessa tarefa. Existe um mercado para seus retratos de dinheiro, cujo valor tem subido substancialmente. Embora seus desenhos não possam ser confundidos com as cédulas oficiais (ele só as pinta de um lado do papel), ele tem sido perseguido por autoridades financeiras como um falsificador de dinheiro. Ele foi processado e absolvido na Austrália e teve material seu apreendido nos Estados Unidos. Na Inglaterra, quando julgado pela acusação de "reproduzir" notas de libras esterlinas, ele conseguiu ser absolvido argumentando que suas pinturas eram únicas e que na verdade as cédulas emitidas pelo Banco da Inglaterra é que eram reproduções.
Na arte de copiar, tudo é questão de ponto de vista.
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