
No primeiro final de semana após a Lei Antifumo ter entrado em vigor, as ruas noturnas mais movimentadas da Capital mostram sinais de adaptação às novas regras, apesar de a prefeitura não ter iniciado a fiscalização. Fumantes se aglomeram nas calçadas e as propagandas começam a desaparecer dos estabelecimentos. Mas há resistência - e até revolta - por parte dos frequentadores e de donos de bares e boates. Sem falar nas dúvidas.
Pelas novas regras, fica proibido o consumo de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou de qualquer outro produto fumígeno em ambientes fechados de uso coletivo, como bares, restaurantes, casas noturnas e ambientes de trabalho, mesmo que o ambiente esteja parcialmente fechado por uma parede, divisória, teto ou até toldo.
É essa parte do toldo que é sinônimo de interrogação para os donos do Pinguim, na esquina das ruas Lima e Silva e República. Uma aba de pouco mais de um metro de comprimento cobre exatamente metade das 30 mesas dispostas do lado de fora do bar. A cobertura funciona como uma "Faixa de Gaza", onde sob ela não pode fumar e logo ao lado pode, ou de qualquer maneira é proibido?
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- Ainda estamos buscando informações junto à prefeitura. Se não puder, vamos mandar tirar o toldo - comunica o gerente do Pinguim, Mario Araújo.
- Chuva não é todo dia que tem, mas fumante, sim - justifica, sob protestos de um cliente:
- E o sereno? Eu não fumo, mas aqui é tudo aberto, não teria problema nenhum. Essa lei é radical demais - vocifera, sem querer se identificar.
Sentado na parte descoberta do bar, o pesquisador de marketing Edson Santos, 25 anos, se levanta e vai fumar a alguns metros dos três amigos. Segundo ele, a atitude já fazia parte da rotina antes da regulamentação da lei, mas passou a ser ainda mais respeitada.
- Eu não gosto quando fumam perto de mim, por que vou fazer isso com os outros? Não importa se tem ou não uma aba, é aglomeração de pessoas e tenho que respeitar - avalia.
Quem discorda é o proprietário do Cotiporã, Sandro Gnoatto. Há três anos, ele fez "o maior investimento do ramo de botecos" - mas sem revelar a quantia - ao instalar, em cerca de 70% do pub, um telhado retrátil.
- Os melhores bares do mundo fizeram isso, nós também. Mas agora não serve de nada. Além do custo de instalação e de manutenção, o movimento do bar reduziu de 30 a 40% - lamenta o empresário.
No local, os clientes têm que pagar a comanda antes de sair e poder fumar na calçada, mesmo que queiram voltar. A sugestão dada pela recepcionista, ainda na entrada, é que, se for mais de uma pessoa, os frequentadores deixem uma comanda em branco, então apresentam ela na saída e podem voltar, sem tem que se dirigir até o caixa. Depois, têm que negociar na hora de rachar a conta.
Ainda na Lima e Silva, três primas aproveitam a noite de sábado juntas no Porto Pub - ou melhor, em parte no pub. De tempo em tempo, uma delas faz a volta, sai do bar e fica próxima da mesa, mas do lado de fora da mureta. Elas não discordam da lei, mas acreditam que deveria-se ter pensado em estruturar melhor a parte mais afetada pela lei.
- Estou aqui, respeitando a lei, na calçada. Mas onde vou botar a bituca? As cinzas? Não tem lixo. Fora o fato de que deixei de incomodar do lado de dentro de bar, mas passei a incomodar fora - comenta Patrícia Lunardi, administradora de 36 anos.
De fato, na calçada estreita de uma das mais movimentadas ruas da badalada Cidade Baixa, Patrícia ocupa pelo menos um terço da passagem. Entre pegar o copo por cima da mureta e bebericar, cuida pra não queimar quem passa na rua. E conseguem enxergar quem tá do "outro lado".
- Agora nós estamos aqui, nos divertindo. Mas e depois, quando formos pra casa, a duas quadras daqui, será que não vai estar cheio de pessoas fumando na rua e fazendo barulho? Será que a gente não tá incomodando quem tá descansando, ao invés de estar dentro do bar? - questiona a assistante social Valéria Lunardi Cardoso, 39 anos.
Para a professora Suzana Oderich Muniz, 51 anos, que está sozinha, do lado de fora do paredão do Dublin, na Rua Padre Chagas, as novas regras são segregadoras.
- A lei não é antifumo, é antifumantes. Fomos exluídos da sociedade de certa forma, expostos à violência. Não pensaram em que já fez a opção de fumar - avalia.
Alexandre Santanna, gerente do Dublin, concorda com ela e, por isso, diz que a casa pensou em deixar o mais agradável possível o deslocamento dos fumantes. O frequentador não precisa pagar a comanda, em troca, deixa um documento com a conta na portaria. Tem uma mesa e cinzeiros em frente. Diz que não há reclamação, pelo contrário:
- Conquistamos um público novo, o de não fumantes que gostam de aproveitar o terraço que deixpou de ser fumódromo. Muitos elogiariam, estamos contentes - conclui.
Entenda o que muda com a nova lei:
