O relato abaixo foi escrito por Camila Nunes, repórter de Zero Hora
Foto: Ronaldo Bernardi/Agência RBS

Nas ruas do centro de Porto Alegre, tempo é questão de segurança. A região é propícia a atropelamentos em cruzamentos movimentados, onde trechos de até 20 metros têm de ser atravessados a pé em apenas 12 segundos. Os pedestres convivem com a correria, a pressão de carros, ônibus, motos e lotações. Reclamam de ficar "em segundo plano".
ZH testou semáforos de cinco regiões consideradas críticas pelos leitores, percorreu o Moinhos de Vento - bairro com a maior proporção de idosos das capitais brasileiras, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) - e os sete entroncamentos com maior fluxo de veículos, conforme a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC).
Entre os semáforos testados, os que exigem mais pressa ficam no cruzamento das avenidas Mauá e Padre Thomé (12 segundos) e nas ruas Uruguai com Siqueira Campos (12 segundos). O pior deles está na Avenida da Azenha com a Princesa Isabel, onde o pedestre tem só 10 segundos para percorrer pouco mais de 10 metros.
O professor da Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e especialista em transporte João Fortini Albano dá nota 5,5 para a cidade e diz que o tempo mínimo para qualquer semáforo deveria ser 15 segundos:
- Em 10 segundos, não dá nem para raciocinar. Há um período de percepção e ação, que para uma pessoa média é de dois a três segundos. Quando começa a travessia, já se foram uns cinco segundos.
Aos 27 anos, o advogado Clayson da Silva Gartelli conta já ter precisado correr para escapar de atropelamentos:
- Estamos em segundo plano, isso precisa ser revisto. Além disso, os motoristas não costumam respeitar quando o sinal fecha para eles.
Apenas 10 segundos para cruzar a Azenha

Ao realizar o teste do tempo das sinaleiras em Porto Alegre, uma pergunta me veio a mente: por que quem dirige um veículo tem mais prioridade do que eu, que sou pedestre? Por que as autoridades, de maneira em geral, não me oferecem as condições necessárias para que eu me sinta segura ao caminhar pela cidade na qual moro e pago meus impostos?
Imagine a seguinte situação, caro leitor: você é cego e precisa atravessar uma via sem ter a certeza de que o semáforo está aberto para você. Surreal, não? Pois foi exatamente isso que vivenciei na Avenida Mauá com a Rua Padre Thomé. Não tive nenhuma indicação de que estava autorizada a cruzar a via. Por sorte, um motorista de ônibus desceu do veículo que conduzia e me ofereceu ajuda.
Mas o pior ainda estava por vir. Tive apenas 17 segundos para passar de um lado a outro da rua. Na Azenha, próximo à Princesa Isabel, o tempo da travessia diminui para incríveis 10 segundos.
Não pretendo aqui criar uma guerra contra os motoristas, afinal, penso que todos devemos respeitar o espaço do outro. Mas quero dizer às autoridades que 17 ou 10 segundos para atravessar uma via não é complicado apenas para mim, que não enxergo.
Considero um desrespeito com todos que precisam ou querem circular a pé pelas ruas de Porto Alegre. Quando o próprio poder público impõe obstáculos aos cidadãos é sinal de que algo vai muito mal em nosso país.
Contraponto
O que diz Paulo Ramires, coordenador de monitoramento da EPTC
Existe uma indicação da Organização Mundial de Saúde de que a média de velocidade de caminhada é 1,2 metros por segundo. Em um sistema de planejamento semafórico, é isso que utilizamos para estabelecer o tempo de travessia. Na maioria dos casos, procuramos usar um metro por segundo.
Temos a garantia das pessoas como princípio, mas administramos um sistema. Tratamos com muita preocupação o pedestre e procuramos permitir que cada um dos movimentos se realize no momento e com o tempo mais seguro.