
No período em que Porto Alegre sediará cinco jogos da Copa do Mundo, pelo menos 83,3 mil estrangeiros estarão na cidade. A chance de topar com um deles por aí é razoável. E é papel da escola ajudar os alunos a aproveitarem o momento para troca de experiências, de culturas e oportunidade para fazer com que os conteúdos de sala de aula ganhem um sentido maior.
As práticas das escolas retratadas abaixo trazem em comum a possibilidade para tornar mais palpável as realidades de outros países e avaliar com um critério maior tudo o que acontece no nosso quintal. Respeitando o nível de desenvolvimento de cada faixa etária, debates, seminários, mostras culturais, a criação de blogs, de aplicativos e brincadeiras são projetos enriquecedores.
Aprender sobre outros países é importante, mas a assessora pedagógica e de Legislação Educacional do Sindicato do Ensino Privado (Sinepe/RS), Naime Pigatto, lembra que seria interessante que os alunos se apropriassem dos aspectos turísticos do Rio Grande do Sul e do país para indicar aos visitantes o que conhecer e falar das tradições e dos hábitos locais.
- O nosso povo é visto como hospitaleiro, então, esta é uma oportunidade de se apropriar desses conhecimentos para tornar esta hospitalidade mais atrativa - aconselhou Naime.
Para Esther Grossi, coordenadora do Grupo de Estudos em Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação (Geempa), vivenciar as situações é a melhor maneira para aprender. Os assuntos que permeiam o Mundial podem ser aproveitados em praticamente tudo, na geografia, no estudo das bandeiras, dos hinos, em temas como a origem da bola e regras de futebol.
Para ajudar professores a aplicarem atividades com as turmas, o Geempa lançou nesta semana o livro Copa do Mundo e Aprendizagens, com mais de cem atividades sobre o Mundial. Dentre as propostas estão uma gincana feita em dois tempos para que as crianças relatem seus conhecimentos antes e depois da Copa.
- Até aspectos críticos do campeonato e o que discutir em sala de aula sobre isso estão contemplados - disse Esther.
Tocar para entender
Foi apalpando minimonumentos históricos que crianças de cinco e seis anos da Escola de Educação Infantil Amiguinhos da Praça, de Porto Alegre, despertaram para a diversidade de países e culturas. A ideia partiu da coordenadora pedagógica Patrícia Ludwig, que coleciona as miniaturas e aproveitou a Copa para incluí-las na sala de aula.
Foto: Tadeu Vilani/ Agência RBS
Em um mapa com os continentes identificados por cores, as crianças do Jardim B relacionam cada objeto com um país.
- Procuramos tirar o foco da competição e da torcida pela vitória do Brasil e estimulamos as crianças com materiais concretos a terem uma noção da diversidade cultural. Nenhum livro ou imagem substitui a experiência de tocar um objeto - explica Patrícia.
Durante o processo, as diferenças culturais foram discutidas por meio do livro Eu e você, aqui e lá, da escritora gaúcha Letícia Möller, que fala sobre crianças de países distintos, compartilhando das mesmas vontades.
E, na medida em que os estudos avançavam, a escola foi espalhando mapas e imagens de crianças vestindo as roupas de sua cultura pelos corredores. Os pequenos entraram no clima e chegam a cada dia com vocabulário e histórias novas.
- Croácia, América e França são palavras soltas. Mostramos o que significam. Falar em Copa do Mundo é complexo porque eles não têm noção do planeta. O globo ajuda neste sentido - conta a coordenadora.
Enciclopédia na mão
A fome na África está entre as preocupações dos alunos da 8ª série da Escola São Francisco, na zona sul de Porto Alegre.
- A pobreza nos chamou muito a atenção porque, no Brasil, vemos gente acima do peso e, na Costa do Marfim, pessoas comendo barro e areia - exclamou Josué Galião Paródia, 14 anos.
Laís Endler, da mesma idade, emendou:
- Serviu para aproveitarmos mais os alimentos do que só comer um pouco e deixar o resto no prato e também para dar valor ao investimento dos nossos pais em nós.
A provocação veio do professor de geografia Rafael Oliveira de Souza, especialista em Informática na Educação. Ele propôs aos alunos que criassem um aplicativo de celular e tablet que funcionasse como uma enciclopédia durante a competição:
- Na hora dos jogos, os usuários podem pesquisar qual cultura há por trás daquela seleção, a base econômica, a relação política.
Foto: Diego Vara/ Agência RBS
Constam no aplicativo informações como área territorial, moeda, clima, história, religiões e obras literárias das 32 nações que participam do mundial.
- O trabalho foi dividido em 32 países da Copa, distribuídos para seis turmas, nas quais a pesquisa e a seleção de informações foi orientada pelo professor - disse Rafael.
O aplicativo é gratuito e pode ser acessado pelo endereço: http://app.vc/guia-de-paises-da-copa
Turmas mais unidas simulam identidades
Em São Leopoldo, os alunos do Colégio Sinodal incorporaram, de fato, costumes e a cultura de outros países. Cada turma - do 6º ano do Ensino Fundamental até o Ensino Médio - escolheu um país para representar. Além de estudarem peculiaridades da nação que interpretam, levam para as competições esportivas promovidas pela escola hábitos, cores e bandeiras desses locais.
Foto: Igor Prudêncio/ Divulgação
Para compor as torcidas, eles confeccionaram camisetas com as cores e os símbolos dos seus países e, na gincana realizada esta semana, pintaram o rosto e se caracterizaram com objetos que remetiam às respectivas culturas. O conhecimento foi composto com a ajuda dos professores.
- As turmas precisam ter a sua tribo. Quando assumem uma bandeira, assumem a identidade como grupo, se tornam mais unidos - diz o vice-diretor Gerson Engster.
Otávio Friedrich, 16 anos, conta que seu grupo escolheu a Espanha para homenagear a orientadora da turma, que dá aula de espanhol. Ela está desenvolvendo trabalhos de arquitetura, cultura, música da Espanha. O adolescente conta estar envolvido com o possível adversário do Brasil, mas na hora do campeonato não vai haver dilema:
- O sentimento nacionalista não vai deixar chegarmos ao ponto de torcer para outros. Mas vou assistir aos jogos da Espanha com o olhar diferente.
A troca das experiências vai ocorrer em uma feira de nações, promovida pela escola em junho.
Dicas para a turma sair ganhando
De 1º a 5º ano
- O professor pode escolher alguns países e pesquisar sobre direitos e deveres de lá. Para tornar mais próximo da realidade do aluno, foque nas seleções que estarão presentes em Porto Alegre. A atividade ajuda a exemplificar as diferenças culturais e a importância de respeitá-las.
- No Google Maps, é possível calcular a distância entre a casa do aluno e o país que estão estudando. Se a viagem a um determinado país leva oito horas, faça as crianças pensarem o que conseguem fazer neste tempo: ir à escola, almoçar, brincar. Assim, fica mais fácil para compreenderem as distâncias.
- Ensinar formas básicas de comunicação em outras línguas, como "bom dia, como é o seu nome?, precisa de ajuda? e obrigado" estimula a ideia de solidariedade e de aproximação entre os povos. Vale, sempre, mostrar à turma, também, onde está o país no mapa, para ampliar a compreensão de mundo.
De 6º a 9º ano
- Como os alunos já estão preparados para pesquisas mais aprofundadas, o professor pode sugerir bibliografia e sites para que eles mesmos busquem as características dos países.
- Explorar temas mais complexos, como a sustentabilidade. Uma ideia é pedir para pesquisarem como as nações tratam o lixo e para observarem o comportamento dos turistas que chegarem. Também, analisar como ficou a cidade depois da Copa. Os textos sobre o que aprenderam podem ser publicados num blog.
- Propor uma conversa com parentes sobre o que sabem de outros países. Entrevistar alguém que viajou para o Exterior, levando em conta o que mais chamou a atenção do viajante e como eram os aspectos culturais daquele país. O resultado das conversas, somado a pesquisas na internet e uso de filmes em sala de aula, também pode enriquecer os trabalhos na escola e aproximar os diálogos familiares.
Ensino Médio
- Desigualdade social e como a política é capaz de amenizar as diferenças podem ser aprofundadas. Uma dica é separar a turma em grupos e cada um ficar responsável por estudar um país, comparando com o Brasil.
- O assunto pode ter a Sociologia como fio condutor, mas com apoio de outros componentes curriculares. O professor de português pode ensinar como construir diferentes tipos de texto para que os alunos escolham um formato e escrevam o que aprenderam. Na História, podem ser trabalhadas as desigualdades sociais na Idade Média. Na Geografia, o espaço físico, gráficos, dados estatísticos e índices de desenvolvimento humano.


