
Entre as grandes atrizes de cinema em atividade, bem poucas conjugam, como a francesa Marion Cotillard, talento e versatilidade para encarnar tipos dos mais variados em diferentes gêneros. E sempre com a mesma intensidade. Aos 41 anos, duas vezes indicada ao Oscar de melhor atriz – venceu com Piaf – Um Hino ao Amor (2007) –, Marion apresenta no drama Um Instante de Amor, de Nicole Garcia, mais uma atuação superlativa. Tão boa que se impõe às fragilidades que o filme apresenta em seu desenrolar.
Um Instante de Amor, em cartaz a partir desta quinta-feira nos cinemas, integrou a seleção principal de Festival de Cannes 2016. É uma adaptação do livro Mal di Pietre, lançado em 2016 pela italiana Milena Agus. A figura central da trama é Gabrielle, mulher emocionalmente instável cuja sexualidade e capacidade de amar serão elementos de combustão numa jornada entre a realidade e o delírio.
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A história de Gabrielle será contada em retrospectiva, a partir do começo dos anos 1960, quando, na companhia do marido, José (Alex Brendemühl), e do filho adolescente, ela será despertada pela lembrança da fugaz paixão vivida anos antes com o militar André (Louis Garrel), que conheceu em um spa na região dos Alpes.
O caminho percorrido por Gabrielle até a frágil estabilidade familiar do presente foi pedregoso. No vilarejo da Provence em que vivia com os pais e a irmã, a protagonista ficou marcada por seus arroubos libertários e temperamentais. Meio a contragosto, aceitou casar-se com o pedreiro espanhol José, por sua vez convencido a aceitar a "missão" pela mãe de Gabrielle, sob o argumento de que a instável filha precisava de um homem com pulso firme.
Se fosse efetivamente contraposto ao espírito independente de Gabrielle, esse viés machista do argumento, mesmo sob o o contexto comportamental da época, poderia ser um elemento de maior robustez na trama. O caminho tomado, porém, é o do melodrama romântico. Ao tratar de um problema que a impede de engravidar, o "mal das pedras" a que faz referência o título original, Gabrielle projeta em André o amor, o desejo e o prazer que desconhece no relacionamento com José.
A ciclotímica Gabrielle tem em Marion uma intérprete iluminada. A atriz mimetiza na sua performance o processo de transformação da jovem rebelde que se abre à paixão vulcânica e inconsequente em mulher madura resignada com o distante afeto que dedica ao marido e ao filho. O desconforto existencial e a sensação de deslocamento é que permanecem imutáveis no correr dos anos.
Um Instante de Amor foi um dos quatro filmes que Marion realizou em 2016, todos ilustrativos dessa reconhecida versatilidade. Já foram exibidos no Brasil Assassin's Creed, morna adaptação do videogame homônimo em que repetiu a parceria com o diretor australiano Justin Kurzel e o ator irlandês nascido na Alemanha Michael Fassbender – com quem fez Macbeth: Ambição e Guerra (2015) –, Aliados (2016), do americano Robert Zemeckis, filme de espionagem ambientado na II Guerra no qual contracenou com Brad Pitt, e o catártico drama familiar É Apenas o Fim do Mundo, do canadense Xavier Dolan.
Em 2017, Marion poderá ser vista na comédia Rock'n Roll: Por Trás da Fama, dirigida por Guillaume Canet, pai de seus dois filhos, e Les Fantômes d'Ismaël (2017), thriller de Arnaud Desplechin, ao lado de outros grandes do cinema francês: Mathieu Amalric, Charlotte Gainsbourg e novamente Louis Garrel.
Um Instante de Amor
De Nicole Garcia.
Drama, França/Bélgica/Canadá, 2016, 120min, 14 anos.
Estreia quinta-feira no GNC Moinhos 3 (14h15, 19h15) e no Guion Center 1 (14h, 16h15, 18h30, 20h45).