Fábio Prikladnicki
Roqueiros que compõem música erudita não são exatamente uma novidade. Que fã não lembra do Concerto for Group and Orchestra, do tecladista do Deep Purple, Jon Lord, com a Royal Philarmonic Orchestra em 1969? Mas agora o fenômeno aparece como traço de uma geração. Influenciados por vanguardistas da segunda metade do século 20, como Steve Reich, John Cage e Olivier Messiaen, integrantes de bandas de rock contemporâneas estão encontrando na música de concerto uma forma de expandir seus horizontes.
É o caso de Richard Reed Parry, multi-instrumentista do Arcade Fire, que lançou, em junho, o disco Music for Heart and Breath, com obras para diversas formações, pela Deutsche Grammophon. Conhecido pelo rigor na seleção de seu elenco, que inclui a imbatível Filarmônica de Berlim, o selo havia colocado no mercado, em março, o álbum St. Carolyn by the Sea/Suite from "There Will Be Blood", com trabalhos individuais de Bryce Dessner e Jonny Greenwood, mais conhecidos como guitarristas da The National e do Radiohead, respectivamente. Dessner já havia tido composições gravadas, em 2013, pelo célebre Kronos Quartet no disco Aheym (pelo selo Anti), e Greenwood dividiu, em 2012, um álbum com seu mestre Penderecki pelo selo Nonesuch.
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O desafio, agora, é enfrentar a resistência de parte do público. Comentários de leitores no site especializado Slipped Disc dividem-se entre boas-vindas aos jovens talentos e acusações de que as gravadoras estariam afrouxando seus critérios para tentar superar a crise da indústria fonográfica. Em depoimento a ZH, o CEO da Deutsche Grammophon, Mark Wilkinson, lembra que o selo tem tradição em trabalhar com artistas de outros gêneros musicais, como Sting e Elvis Costello:
- Muitos músicos de hoje têm formação clássica e trazem a música de concerto dentro de si, cruzando os gêneros com facilidade e empolgação. Estamos entusiasmados por trazer seus trabalhos para uma audiência ampla.
Já a crítica especializada está encarando a novidade com interesse. Richard Whitehouse escreveu na revista britânica Gramophone que o estilo "visceral e distinto" da The National está evidente na obra de Dessner, e Leo Chadburn afirmou no site Sinfini Music que o "experimentalismo delicado e tranquilo" de Parry está "a um mundo de distância da ansiedade tremeluzente" do Arcade Fire. Autor do livro Maestros, Obras-primas & Loucura, o crítico inglês Norman Lebrecht afirma a ZH que ouviu as composições de Jonny Greenwood, as quais considera "excelentes":
- Não acho que devemos nos preocupar demais com categorias. Na era do download, todo tipo de música é misturado no celular ou no notepad, e cabe ao ouvinte dar sentido ao que gosta e ao que gosta menos. Se a música é boa, não precisa ser rotulada como "clássica", "new age" ou qualquer outra coisa. E, se não é boa, nenhum rótulo conseguirá salvá-la.