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Domingo marcará o primeiro dia do resto da vida da Chapecoense. Depois de velar e de entregar os seus heróis aos familiares, torcedores darão um abraço à Arena Condá e o clube ingressará em um processo de reestruturação.
Não será fácil. Todos sabem. Foi assim com o Brasil-Pel que, em escala menor, quando teve dois jogadores mortos em um acidente de ônibus, sete anos atrás, acabou rebaixado à segunda divisão estadual antes de se recuperar e ascender à Série B nacional. A Chape ganhou o abraço do mundo, mas perdeu um time inteiro.
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– A Chapecoense vai recomeçar, isso é certo. Precisamos honrar os nossos jogadores e amigos que morreram nessa tragédia. Mas ainda é cedo para pensarmos nisso. Estamos em luto, ainda é cedo para encontrarmos uma saída – comentou o novo presidente da Chapecoense, Ivan Tozzo.
Além de Tozzo, dono de uma distribuidora de alimentos, o recomeço deverá ser capitaneado por outros dois empresários locais: Plinio David de Nes Filho, presidente do Conselho Deliberativo da Chapecoense, e Gelson Della Costa, vice-presidente do Conselho. Os três deverão formar um conselho de gestão, a fim de tocar o clube em 2017. Não está descartado o auxílio do governo de Santa Catarina para gestionar junto ao Planalto apoio de estatais como patrocinadoras do clube, ao menos para o ano que vem.
Na atual temporada, a Chapecoense trabalhou com um orçamento de R$ 47 milhões – e gastos de R$ 43 milhões. Agora, tudo mudará. Ainda que os associados do clube tenham saltado de 9 mil para 22 mil em apenas três dias, devido à repercussão da tragédia de Medellín e ao auxílio de todos aqueles que se comoveram com o drama catarinense, o clube não sabe por quanto tempo essa comoção se transformará em apoio na prática. Bem verdade que a lojinha oficial da Chapecoense nunca vendeu tanto. Atende a pedidos de todo o Brasil – encomendas para o Rio Grande do Sul e para São Paulo são as campeãs de envios pelos Correios –, pois a camisa do clube virou objeto de culto. O que todos sabem, porém, é que essa comoção não vai durar para sempre e que o time da Arena Condá precisa encontrar novas maneiras de se manter, de se reconstruir.
Ainda que diversos clubes, capitaneados pelo Grêmio, tenham se colocado à disposição para emprestar jogadores gratuitamente, e que haja um plano para conceder uma licença especial ao novo campeão honorário da Copa Sul-Americana, a fim de mantê-lo na Série A do Brasileirão, livre de descenso, por pelo menos três anos, o futuro é incerto.
– Seremos muito mais criteriosos para contratar a partir de agora. Não podemos cometer erros – diz o chefe dos analistas de desempenho da Chapecoense, Vitor Hugo Nascimento. – E não queremos pena de ninguém. Solidariedade é uma coisa, pena é outra. Remontaremos o elenco buscando o mesmo perfil de atletas que tínhamos. Não virão superatletas, não virá Ronaldinho Gaúcho ou Riquelme (informações que passaram a circular nas redes sociais, nos últimos dias). Mas nós vamos nos reerguer – assevera Nascimento.
Do elenco profissional de 2016 da Chapecoense, oito jogadores estariam hoje em condições para atuar. Mais os garotos das categorias de base, atuais vice-campeões estaduais da categoria sub-20. Para o ano que vem, Hyroan, o camisa 10, terá novo endereço: o Palmeiras. Já estava vendido e não viajou a Medellín porque estava lesionado.
– Tínhamos uma grande família aqui. Alguns jogadores já haviam recebido ofertas de outros clubes, pois estavam em fim de contrato aqui, mas decidiram ficar conosco agora – conta Vitor Hugo Nascimento, sem citar nomes, mas um desses jogadores seria o goleiro Marcelo Boeck, ex-Inter.
Profissionais que passaram pela Chapecoense também admitem o retorno ao clube nesta missão de reestruturar a equipe. Um deles é o técnico Gilmar Dal Pozzo. O goleiro do Caxias, campeão gaúcho de 2000, foi quem levou a Chapecoense da Série B para a elite nacional. É uma espécie de herói na cidade. Ainda que tenha assinado contrato com o Ceará no começo da semana – horas antes da tragédia de Medellín –, admite auxiliar o clube a temporada toda.
– Todos nós que passamos pela Chapecoense, que perdemos amigos, devemos ajudar nessa reconstrução. De alguma maneira. Estou à disposição do clube para o que for preciso – afirma Dal Pozzo.
– Tenho mantido contato com outros ex-jogadores do clube. Ainda não sabemos como, mas todos ajudaremos a Chapecoense a se recuperar – assegura o zagueiro Douglas Grolli, cria da Chapecoense, ex-Grêmio, atualmente na Ponte Preta.
Um dos apoios mais emocionantes que o clube recebeu nos últimos dias foi o da tribo kaingang Condá, que habita a região oeste de Santa Catarina e celebra o seu luto com músicas e danças. Vitornio Condá, o cacique que empresta o nome ao estádio da Chapecoense, é um símbolo de bravura e de resistência. E é a partir do seu exemplo de luta que a Chapecoense pretende renascer. Já a partir desse domingo, depois de honrar os seus heróis.
*ZHESPORTES