
Há 10 dias, expressões como branding, plano estratégico, processos, governança, conselho de administração e jeton dividem hierarquia no vocabulário do Figueirense com os termos mais corriqueiros do futebol. Com a velocidade de um furacão e em meio a uma temporada trôpega, o clube entregou suas chaves para um grupo de investidores. Por 20 anos, serão eles que ditarão os rumos no, agora, Figueirense S.A..
O Figueirense Futebol Clube seguirá existindo. Será dono de 5% das ações do clube-empresa, elegerá presidente e manterá seu Conselho Deliberativo. Mas não terá poder de decisão. Apenas fiscalizará as ações dos novos gestores. A notícia correu Florianópolis seguida de uma pergunta: quem são esses investidores?
Leia mais:
Guto Ferreira: "Ficar no Inter em 2018 seria uma realização"
Lincoln revela motivação no Grêmio: "Quero que meu filho tenha orgulho do pai"
O Brasil resiste ao estrangeiro: por que técnicos de fora sofrem para ter sucesso por aqui
A resposta ainda está enevoada e guardada a sete chaves pelo advogado paranaense Cláudio Vernalha, por seu sócio, Luiz Gustavo Mesquita, e pelo matemático Alex Bourgeois, francês de nascimento, com trajetória em bancos e, desde 2010, no futebol, apadrinhado pelo empresário Abílio Diniz. Bourgeois é quem fala pelo trio. Ele será o CEO e acumulará até dezembro a função de diretor-executivo.
Mais do que o segredo, estranha a velocidade com a qual o processo se desenrolou. Entre a apresentação da proposta por Vernalha ao clube e a aprovação no Conselho se passaram 30 dias. O projeto ficou disponível para os conselheiros em um fim de semana no Orlando Scarpelli para leitura. Fotos ou cópias estavam proibidos.
O projeto foi aprovado em 7 de agosto por 85 votos a 2. O presidente do Conselho Deliberativo, Nicolau Haviaras, admite a celeridade, mas garante que os direitos da "associação", como agora se refere ao clube, foram resguardados:
– Realmente, foi num período curto. Mas o contrato ficou bem equilibrado, preservando a associação Figueirense. A preocupação é, quando se desfizer a parceria, assumir com algum recurso para tocar o clube. Isso está bem resguardado no contrato.
Haviaras defende que a velocidade da aprovação está vinculada ao fato de a transformação em clube-empresa já ter sido estudada em comissão especial e aprovada em 2015. Na ocasião, o presidente Wilfredo Billinguer levou ao Conselho o projeto para criação de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), a Figueirense Ltda.
A ideia era deixar o clube pronto para receber um parceiro. Tanto que todos os contratos dos jogadores foram registrados nesta SPE.
O projeto ficou guardado até o fim de junho, quando Vernalha apresentou o projeto do seu sócio, Bourgeois. O advogado transita nas altas rodas de Florianópolis, onde decidiu morar depois do casamento. Ele sabia do interesse do Figueirense e, também, de sua penúria financeira. Não é à toa que está no Z-4 da Série B. O déficit mensal gira em R$ 600 mil e a dívida bate em R$ 73 milhões - deve fechar 2017 em R$ 80 milhões. Sem contar os salários atrasados.
Os novos gestores assumirão os débitos e, como previsto em contrato, precisarão manter o caixa no azul. O plano deles é buscar no mercado interessados em embarcar no projeto. O tíquete mínimo custa R$ 5 milhões. Bourgeois admite que o momento no Brasil intimida candidatos. Garante conversas avançadas com dois grupos do Exterior, donos de grandes europeus. Os nomes estão em sigilo, sob alegação de cláusula de confidencialidade do contrato - o que o deixa ainda mais misterioso.
Embora esteja prevista uma transição de 150 dias, Bourgeois já deu as cartas logo depois da aprovação. Milton Cruz assumiu como técnico, no lugar de Marcelo Cabo, demitido uma semanas antes.
O segundo anúncio de Bourgeois foi o diretor de marketing, Fred Mourão. Por enquanto, nenhum jogador chegou. Mourão, no entanto, tem a camisa 10 neste novo clube. É de sua prancheta que os investidores esperam projetos que turbinem o Figueirense S.A.. O plano é fugir da fórmula dos clubes estatutários, de viver das rendas de TV e de venda de jogadores. Os investidores receberam, além do futebol, a cessão do estádio e querem fazer dele fonte de renda.
– O modelo de gestão do futebol se aproxima ao da indústria de entretenimento. A gente não é diferente da Disney. Ela tem um parque temático. O meu, é o estádio. Ela tem uma TV, nós temos a nossa mídia – compara o CEO.
*ZHESPORTES