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O Tribunal de Contas da União (TCU) alerta há seis anos o governo federal sobre fragilidades no controle da concessão dos financiamentos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
Em 2008, uma auditoria apontou que o "programa está permeado por pontos de fragilidade que permitem a ocorrência de fraudes". Um das principais vulnerabilidades é a verificação dos dados fornecidos para emissão do documento que habilita o produtor a ter acesso ao empréstimo, concedido com taxa de juros mais baixas.
Chamada de Declaração de Aptidão ao Pronaf, a DAP é feita com base em informações declaradas pelos próprios agricultores, que não precisam ser comprovadas. A auditoria identificou 210 mil CPFs vinculados a mais de uma DAP, algo proibido, já que o documento é único. Ainda foram encontrados quase 20 mil beneficiários com renda superior ao limite estabelecido pelo programa, mantido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
Segundo o TCU, também é baixa a fiscalização sobre o uso e o pagamento dos empréstimos, responsabilidade dos bancos. Em muitos casos, não há controle se o dinheiro foi utilizado conforme a finalidade contratada.
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O tribunal fez uma série de determinações e orientações ao governo e aos bancos, verificadas em monitoramentos periódicos. A maior parte dos itens apontados foi atendida. Em 2008, muitas DAPs eram preenchidas à mão, sendo que o atual sistema é informatizado. Após os apontamentos, milhares de DAPs forma canceladas.
O MDA demonstra resistência em modificar o modelo de emissão da DAP.
Nos bastidores, justifica que o público alvo do Pronaf tem dificuldade para reunir a documentação. Se fosse exigida comprovação, o alcance do programa seria restrito. Conforme o TCU, o processo de inscrição dever ser aprimorado ao cruzar informações com outros cadastros do governo.
- O tribunal determinou um maior compartilhamento das informações entre o ministério e os demais órgãos que participam do programa, inclusive o órgãos de controle internos - destaca Charles Evangelista, diretor da Secretaria de Macroavaliação Governamental do TCU.
Atualmente, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) investigam a suspeita de desvios do Pronaf no Rio Grande do Sul. O esquema teria prejudicado 6,3 mil produtores em Santa Cruz do Sul e Sinimbu, e desviado cerca de R$ 79 milhões. Parte do o dinheiro teria irrigado campanhas políticas.
Citado na investigação, o deputado Elvino Bohn Gass (PT-RS) subiu à tribuna da Câmara nesta quarta-feira para se defender. Afirmou estar "profundamente indignado" e ser "vítima de uma grande injustiça". Informou que colocará à disposição das autoridades seus sigilos fiscal, bancário e telefônico.
- Nunca recebi recursos ilegais para financiar campanhas eleitorais. Coloco-me inteiramente à disposição da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário para elucidar qualquer situação. Eu quero ser investigado.
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CGU também alertou governo federal da fraude
As vulnerabilidades do Pronaf também foram alertadas ao governo federal pela Controladoria-Geral da União (CGU). Uma auditoria publicada em 2012 destacou as fragilidades do sistema de inscrição no programa, feita por meio da DAP, com dados apresentados sem exigência de documentação comprobatória.
A auditoria ressalta que as inscrições podem ser feitas de forma descentralizada por entidades credenciadas ao MDA. O modelo é adotado em virtude da capilaridade nacional do Pronaf e da falta de estrutura própria para o ministério realizar a fiscalização.
Segundo a avaliação da CGU, o formato facilita irregularidades, como DAPs duplicadas ou empréstimos concedidos para pessoas com renda superior a permitida. O texto diz que a "ausência de qualquer tipo de verificação, ainda que por amostragem, quanto à validade das inscrições efetuadas. Tal fragilidade pode, dessa forma, facilitar o recebimento de benefícios por público que não preenche o perfil desejado pela política pública em análise."
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O que diz o governo federal
O Ministério do Desenvolvimento Agrário informa que colabora com as investigações da Polícia Federal para proteger os agricultores familiares e o Pronaf. O ministério afirma que, assim que foi informado sobre as denúncias, enviou uma equipe técnica ao Rio Grande do Sul ara apurar os fatos. Ao constatar que os agricultores forem lesados, elaborou um relatório, entregue à polícia.
O que é o Pronaf
Criado em 1996, o Pronaf financia operações de custeio e investimento para projetos individuais ou coletivos de agricultores familiares e assentados da reforma agrária, com condições diferenciadas do mercado. Para a safra 2014-2015, por exemplo, o governo federal liberou R$ 24,1 bilhões para o programa, que é mantido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).