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Contrárias ao piso regional, entidades empresariais podem questionar na Justiça a legalidade do reajuste de 16% proposto pelo governador Tarso Genro se o projeto for aprovado pela Assembleia Legislativa.
Não seria a primeira vez que essa estratégia seria adotada. Em 2001, a criação do salário mínimo estadual foi alvo de uma ação no Supremo Tribunal Federal e, neste ano, o pagamento do benefício para comerciários foi discutido no Tribunal de Justiça. Questionado, o presidente da Federação do Comércio de Bens e de Serviços (Fecomércio-RS), Luiz Carlos Bohn, admite que a possibilidade de recorrer ao Judiciário existe, mas evita o assunto:
- Se tiver amparo jurídico, sim. Mas, neste momento, ainda não podemos falar sobre isso.
Dirigentes de Fecomércio, Federação da Agricultura (Farsul) e Federação das Indústrias (Fiergs) estiveram ontem com depu­tados do PSDB e com o presidente da Assembleia, Gilmar Sossella (PDT), para manifestar contrariedade com o reajuste de 16%. Afirmam que proposta vai aumentar o desemprego e a informalidade.
Presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB-RS), Guiomar Vidor avisa que as centrais sindicais planejam procurar os deputados na semana que vem, além de lotar as galerias a partir de 16 de dezembro, quando o projeto começa a trancar a pauta de votação:
- Vamos fazer a luta política, mas também estaremos preparados para a batalha jurídica.
O projeto foi encaminhado à Assembleia na terça-feira. Um dia depois, a Procuradoria-Geral do Legislativo apontou a existência de uma lei federal que vedaria alterações no piso no segundo semestre de ano eleitoral. Em resposta, Sossella afirmou que a controvérsia seria resolvida pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Ontem, o presidente da CCJ, Heitor Schuch (PSB), disse que a comissão não analisará o projeto, que deve ir direto a plenário.
ENTREVISTA - "A lei deve ser observada"
Chefe da Procuradoria-Geral, setor responsável pela representação da Assembleia em processos judiciais, Fernando Ferreira afirma que uma lei federal impede que o piso seja reajustado em semestre de eleições.
Qual é o problema do projeto de reajuste do piso?
A proposta não contraria diretamente a Constituição, mas contraria o texto de uma lei complementar federal. Então, talvez a inconstitucionalidade seja indireta, e isso pode ser questionado posteriormente. Como o projeto está, corre o risco de os trabalhadores não ganharem nada. Sempre que enxergo alguma situação que considero relevante, minha obrigação é a de levar ao conhecimento da administração da Assembleia.
Mas a lei não veda apenas a instituição do piso regional em semestre de ano eleitoral?
Instituir ou reajustar é absolutamente a mesma coisa, pois o projeto institui um novo valor para o piso. Nas últimas três eleições, essa restrição em relação ao segundo semestre foi respeitada. Em 2010, a Assembleia aprovou o reajuste em junho, dentro do prazo, só que o governo sancionou em julho.
Existem brechas para que as entidades empresariais entrem na Justiça?
Já respondi a pelo menos duas ações de inconstitucionalidade envolvendo questões do piso. Então, sim, são grandes as chances de isso se repetir. Minha preocupação é bem prática e técnica, não é política. Na discussão das palavras, tu jogas como queres. Por isso, tem de olhar a essência, o sentido real que esta lei complementar federal tinha quando estabeleceu esse limitador, que é para ser observado sempre, a cada eleição.
ENTREVISTA - "Não estamos criando o piso"
Chefe do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, órgão de consulta e de assessoramento do governador, Marcelo Danéris afirma que o projeto não é irregular porque não institui o piso regional, apenas o reajusta.
Por que o governo discorda da avaliação da Procuradoria da Assembleia, de que o reajuste do piso seria irregular?
A lei é muito clara e diz que é vedado instituir o piso. E instituir é criar. Não estamos criando o piso, que já existe, estamos determinando o reajuste. A gente sabe de parlamentares que consultaram juristas e obtiveram essa resposta. O piso foi instituído em 2001, então, está resolvido.
Entidades empresariais podem questionar a legalidade do reajuste na Justiça. Isso não pode causar um prejuízo aos trabalhadores?
Primeiro, a Assembleia tem de votar o projeto. Por enquanto, não tem essa possibilidade de entrarem na Justiça. Se a Assembleia aprovar, aí os empresários podem entrar na Justiça, mas para negar isso que está muito claro na lei, e nós não estamos instituindo nada.
Líderes da oposição na Assembleia alegam que, ao propor este aumento de 16%, o governo foi irresponsável. O que o senhor tem a dizer?
Somos responsáveis por fazer o Estado crescer e, ao mesmo tempo, distribuir renda. Fizemos todas as ações de incentivo aos setores produtivos, não aumentamos impostos. Por isso, a indústria gaúcha, no último trimestre, foi a que mais cresceu no Brasil. É bom lembrar que o governo Germano Rigotto (PMDB) deu 20% de reajuste para o piso (em 2003). Então, 16% não é fora de nenhum parâmetro já usado.