
O primeiro protesto do Bloco de Luta pelo Transporte Público contra a previsão de aumento das passagens em Porto Alegre está marcado para as 17h de quinta-feira. O ambiente de alta generalizada nos preços no país pode catapultar o movimento, e a expectativa de organizadores do evento é de que sirva como aglutinador. Ainda mais com o reajuste pedido pelas empresas de ônibus, de 18,3% (o que elevaria a passagem de R$ 2,95 para R$ 3,49 na cidade), considerado surpreendente pelo representante do DCE da UFRGS e da Assembleia Nacional de Estudantes - Livre (Anel) no Bloco, Matheus Gomes
- Surpreende um pouco esse valor porque se trabalhava com a possibilidade de reajuste entre R$ 3,10 e R$ 3,20. Isso pode dar um caldo superior, se conseguirmos trabalhar bem com essa informação. Pode ser que mobilize mais gente. Estamos diante de um aumento geral do custo de vida. O transporte chega a custar 30% dos orçamentos das famílias. O tarifaço pós-eleições está mexendo com a população - analisa.
Assim como em 2013, ano dos protestos gigantes pelo país, a tarifa pode dar o pontapé inicial para mais reivindicações se agregarem. Naquele ano, o processo foi inesperado. Dessa vez, a estratégia é consciente, afirma Gomes. O grande desafio será unir novamente os diferentes grupos que já têm suas pautas, como os movimentos negro, por moradia, sindicalista e da juventude, por exemplo. No ano passado, a maior debilidade que o Bloco enfrentou foi justamente a falta de uma unificação, segundo Gomes.
Para esse primeiro protesto, Gomes espera que haja um comparecimento de pelo menos mil pessoas - 300 estiveram na assembleia do Bloco que definiu os termos da manifestação, em 26 de janeiro, e mais de 2 mil confirmaram presença na página do evento no Facebook. Não se descarta que, depois do protesto, uma pauta de reivindicações seja montada para dialogar com a prefeitura. O foco deverá ser a encampação do transporte pelo poder público.
- Não basta lutar contra o reajuste. A gente quer tirar os empresários do controle do transporte. Na nossa opinião, essa licitação dos ônibus é um lobby entre prefeitura e empresas - afirma.
O diretor-presidente da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), Vanderlei Cappellari, criticou a motivação do protesto. Ele questionou se não seria melhor os manifestantes reclamarem da alta do diesel, por exemplo, cujo preço é um dos formadores da tarifa de ônibus.
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PSOL entrará na Justiça entre quarta e quinta-feira
Como em 2013, quando obteve a volta do valor da passagem a R$ 2,85, depois de ter sido dado reajuste para R$ 3,05, o PSOL tentará novamente bloquear o aumento na Justiça. O argumento é claro: as empresas não foram selecionadas por meio de licitação, portanto, não podem reivindicar reajuste de passagem, aponta o deputado estadual Pedro Ruas, autor da ação popular ao lado de colegas de partido (Fernanda Melchionna, Roberto Robaina, Luciana Genro, Alex Fraga e Ester Ramos).
- Esse valor é um absurdo. Eles boicotaram dois processos licitatórios seguidos. A obrigação de licitação foi uma determinação do Poder Judiciário. A prefeitura fez e eles não se inscreveram. Eles querem todos os bônus da atividade e não se submetem ao mínimo legal, a Constituição Federal - diz Ruas.
Nada mudou no Comtu, diz conselheiro
Toda a discussão que se formou sobre se o Conselho Municipal de Transportes Urbanos (Comtu) é um instrumento efetivo de análise do cálculo da passagem ou somente um carimbador do que vem da EPTC, motivada pelos questionamentos feitos desde os protestos de 2013, não resultou em alterações profundas no funcionamento do conselho. A opinião é do conselheiro Luís Afonso Martins, também delegado sindical da Carris.
- Tinha se especulado que mudaria alguma coisa. Mas não mudou. Nos últimos 10 anos, pelo menos, foram um ou dois conselheiros que votaram contra. A maioria das cadeiras é de representantes da prefeitura. Então, esse jogo é praticamente jogado - afirmou.
O caminho da tarifa
- Reajuste dos rodoviários: é o pontapé inicial do processo de cálculo da nova tarifa de ônibus. Em 28 de janeiro, a categoria aceitou a proposta das empresas, de 8% de aumento.
- Nesta terça-feira, as empresas apresentaram o seu pedido de reajuste, de 18,3%, o que resultaria em uma tarifa de R$ 3,49.
- Entregue a documentação à EPTC, o órgão de trânsito da prefeitura começará a fazer as suas próprias contas, confirmando ou não o valor pedido pelas companhias. Esse processo pode levar uma média de 15 dias.
- Encerrados os cálculos, a EPTC repassará a documentação com o valor da tarifa técnica para o Conselho Municipal de Transportes Urbanos (Comtu), formado por representantes de órgãos governamentais e da sociedade, que analisa o material e dá seu parecer (sem poder de vetar o reajuste).
- O Comtu encaminha a documentação para a prefeitura. Cabe ao prefeito vetar o aprovar o aumento.
O histórico recente dos embates no transporte público da Capital
2013
- O ano de 2013 entrou com tarifa de R$ 2,85 em Porto Alegre. Após aumento de 7,5% dos rodoviários, as empresas pediram aumento para R$ 3,30. Depois de um mês de análise, a prefeitura definiu o valor de R$ 3,05.
- Nos primeiros meses daquele ano, manifestantes já pediam a redução do preço em protestos nas ruas. Em 27 de fevereiro, houve violento confronto com a BM. Era o início da onda de protestos que varreria o país.
- Em março, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) determinou mudança na formação da tarifa com a retirada da frota reserva do cálculo, abrindo caminho para a redução da passagem.
- Uma liminar do PSOL foi acatada em 4 de abril pela Justiça, fazendo a tarifa voltar ao valor anterior, R$ 2,85.
- O TCE emitiu cautelar em junho para que a EPTC mantivesse o valor da passagem em R$ 2,85.
- Ainda em junho, as manifestações contra o preço das passagens, iniciadas em Porto Alegre, se espalharam pelo Brasil e atingiram seu auge durante a Copa das Confederações.
- No início de julho, os vereadores aprovaram a isenção do Imposto Sobre Servicos de Qualquer Natureza (ISSQN) no transporte publico, e a passagem foi reduzida para R$ 2,80.
- No final de julho, as empresas de ônibus ingressaram com ação na Justiça pedindo indenização de R$ 26 milhões por perdas com a tarifa mais barata.
- A prefeitura anunciou em setembro que abriria licitação para o sistema de ônibus da Capital até dezembro.
- Em dezembro, o TCE intimou a EPTC a prestar esclarecimentos sobre a sua inspeção especial no órgão da prefeitura. Os documentos foram entregues.
2014
- Durante o verão, rodoviários fizeram uma greve de 15 dias, pontuada por fortes embates que paralisaram o transporte coletivo da cidade.
- No fim de janeiro, a Justiça deu 30 dias para que a prefeitura iniciasse processo de licitação para concessões ou permissões do serviço de transporte coletivo da Capital. O prazo, mais tarde, foi estendido.
- Em fevereiro, as empresas de ônibus protocolaram o pedido de reajuste da tarifa de ônibus. A solicitação dos empresários ocorreu após a definição do dissídio dos rodoviários, no Tribunal Regional do Trabalho (TRT).
- O edital foi publicado no dia 31 de março, no Diário Oficial de Porto Alegre. Foi estabelecido que as propostas seriam entregues em 3 de junho.
- Depois dos trâmites necessários, o novo valor da passagem foi aprovado em R$ 2,95 em abril.
- Em 2 de junho, o TCE suspendeu a licitação após receber representações da ATP e de vereadores do PT. No dia seguinte, o tribunal de Justiça Negou a suspensão, mas, a seguir, nenhuma empresa apresentou proposta.
- Novo edital foi publicado em 19 de setembro, reformulado para possibilitar a participação de empresas de fora do país.
- Em novembro, outra vez a licitação resultou deserta: sem interessados. O prefeito José Fortunati anunciou, então, que o próximo edital vai prever concorrência por cada linha da cidade, e as que não tiverem interessados poderão ser encampadas pela Carris. A promessa é lançar o edital em abril de 2015.
2015
- Os rodoviários da Capital protocolam pedido de reajuste salarial de 11,5% em 5 de janeiro.
- A contraproposta das empresas é de 8%. Uma assembleia da categoria para decidir sobre o percentual teve final polêmico em 20 de janeiro. Apesar de aparentemente a maioria dos trabalhadores rejeitar os 8%, o presidente do sindicato da categoria, Adair da Silva, encerrou a consulta e afirmou que ela deve ser feita de forma fragmentada, ou seja, por empresa.
- Oito dias depois, na votação nas garagens das empresas, a proposta de 8% foi aceita.
- Nesta terça-feira, as empresas apresentaram o seu pedido de reajuste, de 18,3%, o que resultaria em uma tarifa de R$ 3,49.
Veja a evolução do valor das passagens de ônibus em Porto Alegre (% em reajuste)
2005 -12,9%, R$ 1,75
2006 - 5,71%, R$ 1,85
2007 - 8,1%, R$ 2,00
2008 - 5%, R$ 2,10
2009 - 9,52%, R$ 2,30
2010 - 6,52%, R$ 2,45
2011 - 10,2%, R$ 2,70
2012 - 5,56%, R$ 2,85
2013 - R$ 2,80*
2014 - 5,66%, R$ 2,95
* O valor sancionado pela prefeitura foi R$ 3,05, mas decisão judicial manteve em R$ 2,85. Com isenção de pagamento do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) pelas empresas de ônibus, o preço caiu para R$ 2,80.