
Enquanto o Ministério Público realizava a primeira audiência de um inquérito sobre o descumprimento da lei que prevê, no mínimo, 30 segundos para a travessia do pedestre em faixas de segurança com semáforo em Porto Alegre, pedestres e motoristas demonstraram o desrespeito à sinalização do trânsito em vias de grande fluxo na cidade, colocando-se ou criando situações de risco.
Na esquina da Avenida Siqueira Campos com a Rua Uruguai, a uma quadra do Mercado Público, muitos não aguardavam o sinal verde para atravessar. Entre os que esperaram sua vez, estava Telmo Araújo, 60 anos, aposentado. Caminhando com um pouco de dificuldade, após romper o tendão de Aquiles, chegou ao outro lado no tempo máximo de travessia - 12 segundos.
Leia mais
Cruzamentos mais arriscados para os pedestres na Capital
Todos os semáforos para pedestres da Capital indicarão tempo
- Quem está machucado ou tem idade avançada não consegue atravessar nesse tempo. É um perigo. E os motoristas não respeitam os velhos - afirma Araújo.
Telmo Araújo cruzou a Siqueira Campos no tempo máximo de travessia
Foto: Mateus Bruxel, Agência RBS

Na audiência realizada na tarde desta sexta-feira, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) informou que os 30 segundos do Estatuto do pedestre não estão sendo cumpridos pois a legislação entra em conflito com a resolução 483 do Contran. Por essa interpretação, o órgão encaminhou um pedido de análise jurídica à Procuradoria-Geral do Município (PGM) sobre o tema, e ainda não obteve um retorno.
- Além disso, ressaltamos que deve ser votado na segunda-feira um projeto de lei que revoga esta emenda, de autoria do vereador Nereu D´Ávila (PDT) - afirma Vanderlei Cappellari, diretor presidente da EPTC.
O texto retira do Estatuto do Pedestre duas emendas que o prefeito José Fortunati iria vetar. Entretanto, por um erro técnico, o veto não chegou em tempo hábil à Câmara, e a lei foi aprovada com a emenda dos 30 segundos, de autoria do vereador Marcelo Sgarbossa (PT).
Independente do resultado da votação de segunda-feira, o órgão se comprometeu a apresentar um cronograma para a formação de um grupo de trabalho que vai discutir os pontos críticos de travessia de pedestres e a adequação das sinaleiras.
- O pedestre é prioridade. Vamos levar nossos estudos à próxima reunião, contemplando também a implementação da resolução 483, que normatiza a sinalização semafórica - esclarece Vanderlei Cappellari.
Carro avança sobre a faixa de segurança na esquina da Salgado Filho com a Borges de Medeiros, enquanto pedestres ainda não concluíram a travessia
Foto: Mateus Bruxel, Agência RBS

Sgarbossa, que entrou com a representação que motivou a abertura do inquérito, comemora o resultado da reunião.
- O promotor Luciano Brasil afirmou que, se o projeto que revoga os 30 segundos for aprovado, será alterado o objeto do inquérito, passando o foco para a preservação dos direitos do pedestres em vulnerabilidade. Além disso, é positiva a criação do grupo de trabalho - comenta o vereador.
Na Ramiro Barcelos, próximo à esquina com a Rua Gonçalo de Carvalho, na calçada onde estão um hospital e um colégio, a uma quadra de um shopping, está um semáforo de oito segundos para atravessar três pistas. O britânico Frank Robinson, 56 anos, surpreendeu-se com o tempo exíguo:
- Para pessoas mais velhas, não há como atravessar nesse tempo. Deveria ser o dobro - afirma o engenheiro, que mora em Durham.
Em Porto Alegre a trabalho, por um mês, Frank tem andado muito a pé, e está um tanto assustado com o trânsito:
- Está cheio de motoristas que dirigem como loucos. Eu mesmo vi um ciclista ser atropelado perto da PUCRS. Na minha cidade, a maioria das faixas de segurança tem sinaleira, com botão para os pedestres. Aqui, atravessar onde não tem sinaleira é um pouco como um roleta russa - compara.
Frank considera que há muito desrespeito ao pedestre em Porto Alegre
Foto: Mateus Bruxel, Agência RBS

As reclamações dos pedestres não se resumem ao tempo de travessia. Vários citaram o que os carros já acelaram quando aparece o sinal vermelho piscante para o pedestre.
- Há uns 15 dias, um morador de rua estava atravessando a faixa de segurança na Ipiranga e não acelerou para concluir a travessia. Aí um motorista, um senhor de meia idade, desceu de seu carro de luxo e ameaçou bater nele. Foi horrível - conta Sandra Maria de Oliveira Costa, 57 anos, auxiliar de laboratório.