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O aeroporto de Manágua não se parece nem um pouco com o que era quando aterrissei ali a primeira vez com um corte de cabelo sem graça, dois microscópios doados e a cabeça cheia de um idealismo inocente. Foi em 1985, quando a revolução sandinista e a campanha dos "contras", com o aval dos EUA, estava a todo vapor. Eu tinha trancado a faculdade para acompanhar esse processo de perto e ajudar no que fosse preciso - inclusive dar aulas - e acabei ficando quase três anos.
Na alfândega da época, um compañero de roupas militares insistiu, em espanhol, que eu preenchesse os formulários novamente. Folheando o meu passaporte norte-americano, percebeu que eu tinha nascido na Alemanha, mas pareceu meio decepcionado por ver que meu local de nascimento ficava na metade ocidental do país e não na oriental, a socialista. Para dizer a verdade, eu também fiquei bem decepcionada, principalmente porque os microscópios, que seriam usados em uma clínica médica no interior, foram confiscados.
Em agosto do ano passado, percebi que muita coisa tinha mudado. No aeroporto, agora com ar-condicionado e portas automáticas de vidro, um oficial me deu as boas-vindas com um cumprimento mais que expansivo e ninguém nem olhou para a minha mala de 23kg, lotada de presentes para velhos amigos.
Estava voltando para a Nicarágua depois de 25 anos, em parte para ver a minha filha, Willa, 15 anos, que estava passando um mês ali para melhorar o espanhol (e o bronzeado, segundo ela mesma) e em parte inspirada pelo desejo nostálgico de comparar a realidade dessa nação centro-americana de hoje com o país revolucionário das minhas lembranças.
Descobri um lugar muito mais desenvolvido, embora continue sendo um dos países mais pobres do hemisfério. É também uma terra de belezas naturais extraordinárias e comida maravilhosa. E encontrei coisas que nunca tinha visto antes: centros de ecoturismo na belíssima costa do Pacífico e nas florestas intocadas que, há 25 anos, eram ocupadas por guerrilheiros.
Há cafés e quiosques em todo lugar. Uma das primeiras frases em espanhol, aprendida nos austeros anos 1980, foi "no hay" (não tem), que era o que mais se ouvia em resposta a um pedido em restaurantes ou lojas. Dessa vez, só ouvi "hay".
Procurando Granada
Manágua, apesar da expansão do setor da construção, ainda traz as marcas do terremoto de 1972 que quase a destruiu. Muitos turistas evitam a cidade, embora seja um lugar excelente para comer, fazer compras e receber uma massagem de primeira classe por US$ 10 no Instituto de Estudos Superiores de Medicina Oriental e Natural, onde tive uma sessão de shiatsu.
Uma hora depois, totalmente relaxada, fiz o percurso de 45 minutos até Granada, um elegante conjunto de casas coloniais espanholas e igrejas dos séculos 18 e 19, às margens do Lago Nicarágua, para encontrar minha filha em seu novo ambiente. Como no resto do país, os endereços não são simples nomes seguidos de um número.
Por telefone, a "mãe temporária" de Willa nos disse para virar no hospital ("O antigo ou o novo?", perguntou o pessoal que estava comigo), seguir uma quadra e meia para o sul e procurar uma casa pintada de "color mamón", referindo-se ao alaranjado do interior do mamão maduro. Eu ouvi mal e em vez de procurar a cor de "mamón", saí atrás da cor de "jamón" (presunto).
Quando finalmente encontramos Willa - e sua "irmã temporária", Wendy -, levamos as duas para comer um doce na Espressonista Specialty Coffeebar & Restaurant, café situado em uma casa antiga magnífica, com direito a pátio coberto por palmeiras e hibiscos. Andrés Lazar, um dos donos, é um dos nicaraguenses que buscaram refúgio fora do país durante os 10 anos da guerra civil que terminou em 1990 com a derrota eleitoral dos sandinistas.
Selva Negra Mountain Resort, pousada e fazenda de café entre Matagalpa e Jinotega
Foto: Oswaldo Rivas, The New York Times
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Um resort no Norte
Um dos maiores prazeres da segunda viagem foi poder explorar o norte do país, montanhoso e luxuriante, onde ficam as pequenas fazendas de café e as plantações em terraços se escondem sob um véu de neblina. Por muito tempo, a área foi zona de guerra.
Passamos a noite no Selva Negra Mountain Resort (inspirado na Floresta Negra), uma pousada e fazenda de café no meio do caminho entre Matagalpa e Jinotega administrada por imigrantes alemães desde o século 19.
Todas as construções, incluindo os chalés de pedra e madeira dos hóspedes aos quais só se chega por trilhas floridas que serpenteiam no meio da floresta, têm telhados espontaneamente verdes - samambaias, orquídeas e bromélias que nasceram na cobertura de resquícios orgânicos que caem das copas das árvores. Um dia, bem cedinho, saí para uma caminhada e dei de cara com dois agoutis, um roedor típico da região que lembra um pouco o porquinho-da-índia.
A solidão era quase palpável - até que ouvi o grito do anasalado do guardabarranco, ave nacional da Nicarágua.
Morgans Rock Hacienda & Ecolodge é um resort e reserva natural na costa pacífica
Foto: Oswaldo Rivas, The New York Times
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Descansando no Pacífico
A 90 minutos a oeste, passando por arrozais pontilhados por garças e cabeças de gado, chegamos à cidadezinha de Estelí, onde coordenei um grupo de voluntários norte-americanos que construíram casas para uma cooperativa agrícola. Na época, a estrada que levava à propriedade era ladeada por campos de fumo não cultivados. Um ano após o término da construção, voltei para uma visita e descobri que todas tinham sido abandonadas depois de um ataque dos contras que dizimou metade dos moradores.
Nessa viagem, mal reconheci o local da tragédia. Estelí e seus arredores estavam completamente diferentes.
Convenci Willa a se reunir a mim a 400 quilômetros de Estelí, onde deparamos com as praias imaculadas de San Juan del Sur e ondas que atraem surfistas do mundo todo. Preferimos deixar de lado a aula com prancha para dar um mergulho na piscina de água salgada do Morgan's Rock Hacienda & Ecolodge, um resort belíssimo e reserva natural que inclui passeios de caiaque e mergulho noturno para observação de tartarugas marinhas na diária.
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