Como filme de gângster, Aliança do Crime é apenas eficiente na reconstituição que faz da curiosa trajetória de um dos mais famosos e violentos criminosos dos Estados Unidos: James "Whitey" Bulger, americano de sangue irlandês que reinou na cidade de Boston entre os anos 1970 e 1990 à frente de uma rede de assassinatos, tráfico, extorsão e prostituição. Deixou como legado um volumoso rastro de sangue de inimigos e também de companheiros que traíram sua confiança. Aos apreciadores do gênero, Aliança do Crime pode parecer um convencional genérico das produções de Martin Scorsese sobre o tema. Scorsese que, aliás, apresentou Jack Nicholson em um personagem inspirado em Bulger no oscarizado Os Infiltrados (2006).
O filme que estreia hoje nos cinemas, porém, torna-se bastante interessante pelos aspectos que destaca da história de Bulger. São elementos que, transpostos do microcosmo policial para uma escala global, iluminam questões controversas do mundo contemporâneo. Como, por exemplo, o vale-tudo para se alcançar determinado objetivo que atropela barreiras éticas e morais e, por vezes, gera um efeito colateral ainda mais danoso que o suposto mal combatido - as históricas intervenções militares das grandes potências no Oriente Médio e no sul da Ásia ilustram esta premissa.
"A Floresta que se Move", com Ana Paulo Arósio, moderniza Shakespeare
Daniel Feix: "Dheepan" é um ensaio poderoso sobre os refugiados na Europa
James Bond mantém o pique mas vacila no rumo em "007 Contra Spectre"
Olmo e a Gaivota acompanha transformações na vida de atriz grávida
Aliança do Crime faz referência à inusitada parceria de Bulger com o FBI, a partir em 1975, quando ele foi chamado para ajudar a polícia federal americana a desbaratar operações da poderosa máfia italiana que ganhava corpo em Boston. O acordo, que parecia bom para os dois lados, acabou alimentando no correr dos anos a força e os negócios ilícitos de Bulger, então visto como um marginal menor e com raio de ação paroquial. A operação acabou saindo do controle e foi denunciada pela imprensa em meados dos anos 1990, colocando o gângster em fuga na lista dos mais procurados dos EUA e fazendo rolar cabeças graúdas.
Na trama dirigida por Scott Cooper, Bulger é vivido com vigorosa competência por Johnny Depp, ator que vem oscilando momentos de altos e baixos na carreira (vej­a abaixo). Sob pesada maquiagem, Depp compõe um tipo de aparência diabólica que cumpre com inteligência e implacável frieza sua rota criminosa sob a vista grossa das autoridades.
A trajetória que fez Bulger famoso, destaca o filme, foi desenhada sobre uma peculiar triangulação de poderes: seu irmão, William "Billy" Bulger (papel de Benedict Cumberbatch), era um senador muito influente na cidade, e um amigo de infância com quem cresceu na comunidade irlandesa, John Connolly (Joel Edgerton), era o agente de FBI encarregado de caçar os mafiosos italianos.
Connolly vendeu aos superiores a ideia de que Bulger, com seu conhecimento do submundo, podia ser valioso na operação. Vaidoso com a projeção que o caso lhe deu, Connolly passou a ser usado pelo amigo marginal ao ponto de ficar cada vez mais difícil para ele desviar do caminho que o fez flertar com a corrupção e ser conivente com os crimes de Bulger. Imaginava o agente que estava fazendo o bem quando havia se tornado um dos tentáculos que alimentavam o mal. É a ingenuidade ou má fé que costumam mover os interesses daqueles que estendem a mão ao diabo sem considerar o ajuste de contas que deverá ser feito mais adiante.
Aliança do Crime
De Scott Cooper.
Policial, EUA, 2015, 126min, 16 anos.
Estreia quinta-feira hoje nos cinemas
Cotação: 3/5
Johnny Depp em alta
Parceria com Tim Burton
Já rendeu filmes memoráveis como Edward Mãos de Tesoura (1990) e Ed Wood (1994).
Donnie Brasco (1997)
A história real do agente do FBI que se infiltrou na máfia de Nova York apadrinhado por gângster (Al Pacino).
Piratas do Caribe
Na franquia iniciada em 2003, Depp consagrou o corsário falastrão Jack Sparrow.
Em Busca da Terra do Nunca (2004)
Indicação ao Oscar de melhor ator vivendo o dramaturgo e escritor James Matthew Barrie, criador do Peter Pan.
Inimigos Públicos (2009)
Encarna outro célebre mafioso, John Dillinger, que tocou o terror na Chicago dos anos 1930.
Johnny Depp em baixa
Enigma do Espaço (1999)
Nada funciona neste confuso thriller em que ele vive ex-astronauta cuja mulher pode estar grávida de alienígenas.
O Turista (2010)
O ator naufraga na companhia de Angelina Jolie nessa mistura de ação, romance e suspense sobre professor envolvido em uma perseguição policial.
O Cavaleiro Solitário (2013)
Tentar repetir a fórmula de Piratas do Caribe no Velho Oeste foi constrangedor.
Transcendence - A Revolução (2014)
É um cientista especialista em inteligência artificial que vira cobaia de perigoso experimento.
Mortdecai - A Arte da Trapaça (2015)
Não fosse Aliança do Crime, o 2015 de Depp poderia ficar marcado pelo mico que é essa trama policial em que vive especialista em artes recrutado para investigar crime.
