
A decisão do ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou o afastamento do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), provocou discórdia entre constitucionalistas. Alguns defendem a atitude da Suprema Corte, outros acreditam que não deveria haver interferência entre dois poderes independentes.
O mérito da discussão é a linha sucessória da Presidência da República, que não poderia ser preenchida por réus – tese defendida pela maioria dos ministros do STF, em julgamento interrompido em novembro após pedido de vistas de Dias Toffoli. Conforme o artigo 79 da Constituição, os possíveis nomes em caso de ausência ou afastamento no Palácio do Planalto respeitam a seguinte ordem: vice-presidente, presidente da Câmara, presidente do Senado e presidente do STF.
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Como Renan é réu na Corte, Marco Aurélio acatou pedido da Rede Sustentabilidade, que argumentava em pedido de liminar que ele não poderia estar nessa relação. A medida ainda precisa ser referendada por outros ministros, e dela cabe recurso.
Para Eduardo Carrion, professor titular de Direito Constitucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP), o STF tem toda liberdade para interferir em casos como esse. Segundo ele, não há conflito entre os Poderes.
– O STF, na sua função de interpretação e aplicação da Constituição, se transforma em instrumento da lei, essa sim está acima dos Poderes. Coordena e regula a ação deles. Há um entendimento claro da maioria de que réu não pode assumir a Presidência – analisa Carrion.
Lenio Streck, professor de Direito Constitucional e Hermenêutica da Unisinos, ex-procurador de Justiça e advogado, sustenta que o STF não tem competência para afastar o presidente do Senado.
– A Constituição não prevê essa hipótese. É incorreto pretender aplicar ao presidente do Senado, seja por analogia, seja por figurar na linha sucessória, o disposto pelo art. 86 , § 1.º, I, da Constituição, porque esse dispositivo se refere tão somente à responsabilização do presidente da República, na vigência do seu próprio mandato e por atos não alheios ao exercício do seu mandato presidencial. O Supremo fez uma interpretação forçada. Na verdade, o Ministro Marco Aurélio fez uma "emenda" à Constituição – afirma Streck.
A decisão monocrática de afastar um presidente do Legislativo não é nova. Em maio deste ano, o ministro Teori Zavascki determinou o afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do mandato de deputado federal e da presidência da Câmara, acatando um pedido de liminar da Procuradoria-Geral da República.
O pedido de afastamento de Renan Calheiros segue o mesmo raciocínio de outra solicitação da Rede Sustentabilidade. Ela começou a ser analisada no Supremo, mas foi interrompida por pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Seis ministros votaram que um parlamentar alvo de ação penal não pode ser presidente da Câmara ou do Senado e, como consequência, integrar a linha sucessória da presidência. Ainda não há prazo para a ação voltar à pauta do pleno do STF.
*Zero Hora