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A mamãe estreante e seu quarteto passam muito bem: Luciane Carvalho, 37 anos, administradora de empresas que sonhava com a maternidade e optou por uma produção independente, engravidando de quadrigêmeos em uma inseminação artificial, passou por uma cesariana bem-sucedida no último dia 29. A moradora de Alvorada, que teve sua história retratada em Zero Hora em 1º de agosto, vem exercitando os primeiros cuidados na unidade de terapia intensiva (UTI) neonatal do Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, onde os bebês, prematuros de 33 semanas, estão internados.
A alta está prevista para quando atingirem dois quilos de peso – é provável que o primeiro deles possa ir para casa em cerca de duas semanas. Luciane ainda está em recuperação, com sessões de fisioterapia para restabelecer os movimentos, depois de ter passado mais de dois meses em repouso absoluto, e deve ser liberada nesta quinta-feira.
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A nova família começa a se conhecer e a se adaptar. Todos os bebês já respiram sem a ajuda de aparelhos. Quatro vezes ao dia, Luciane tira leite, que é repassado aos filhos via sonda, além de um complemento. Ela observa a hora do banho – de "gato", dentro da incubadora, ou em uma bacia –, dá colo, canta e conversa baixinho com cada um: "Tomou banhinho?", "Tá cheiroso!", "Como você dormiu?".
– É muito bom. Eles me dão muita força, recarregam as minhas energias. Estou amando isso. Estou muito realizada – diz Luciane. – Me preparei para um momento muito difícil em relação à saúde deles, procurei me conscientizar de que poderiam acontecer algumas coisas. No entanto, eles estão muito bem. Meu sentimento é esse: agradecer muito, agradecer a força deles, a gradecer a Deus.
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Luciane começou a cogitar a maternidade mesmo sem a presença de um companheiro após relacionamentos que não deram certo. Considerou também a adoção, mas a vontade de passar pela experiência da gestação a levou a optar antes pela reprodução assistida. A administradora ainda pretendia aguardar alguns anos, mas o adoecimento do pai, o aposentado João Luiz Carvalho, 68 anos, em setembro passado, foi determinante para uma antecipação dos planos. Luciane se submeteu a uma inseminação artificial, com sêmen de doador desconhecido obtido junto a um banco de sêmen. Confirmada a gestação, apareceram três bebês na primeira ecografia. O quarto ficaria visível só no segundo exame.
– Senti pavor. Me assustei muito. Minha cabeça não parava – recordou Luciane, que ficou em choque e se isolou por dois dias para tentar digerir a notícia, na primeira entrevista à reportagem.
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A cesariana "especial" teve a participação de 15 profissionais – em geral, o procedimento costuma mobilizar seis pessoas. Em menos de cinco minutos, os quatro bebês foram retirados da barriga da mãe: Nicolas chegou primeiro, às 10h43min, com 1,635 quilo e 41 centímetros. Na sequência, vieram Antonella (1,940 quilo e 41 centímetros, às 10h44min), Sofia (1,580 quilo e 41,5 centímetros, às 10h45min) e Valentina (1,395 quilo e 38,5 centímetros, às 10h47min). Um fato incomum marcou a cirurgia: Antonella nasceu dentro da bolsa amniótica, empelicada, o que dá à criança a aparência de estar dentro de uma cápsula – geralmente, o invólucro se rompe no momento da saída do nenê, o que não aconteceu no caso da menina. A ginecologista e obstetra Karla Simon Brouwers, que conduziu o parto, diz que, do ponto de vista médico, essa particularidade não tem nenhuma implicação.
– Existe a crença popular de que a criança que nasce dentro da bolsa vai ser iluminada e sortuda – comenta a médica, festejando o sucesso de sua primeira experiência com quadrigêmeos.
Acompanhada da irmã, a fotógrafa Deise Carvalho Cansi, 40 anos, no centro obstétrico, Luciane teve um rápido contato com os filhos antes que eles fossem levados para a UTI neonatal. "Mamãe tá aqui", disse-lhes quando foram posicionados perto do seu rosto.
– Foi uma sensação única. Desmoronei chorando – lembra a mãe.
A rotina que será adotada em casa ainda está sendo planejada. Luciane deverá contar com a ajuda de uma babá e de mais alguém. Ercio de Oliveira Filho, pediatra e chefe da UTI neonatal do Mãe de Deus, diz que a fase atual, em que a mãe ainda conta com a equipe assistencial, é fundamental para que ela possa aprender o máximo possível, treinar e "perder o medo". Um dos maiores desafios será a amamentação. Segundo o médico, é preciso verificar a quantidade de leite que a mãe será capaz de produzir, observar o comportamento das crianças e organizar um esquema que seja, além de executável, bom para todos.
– Quanto mais leite dela ela puder dar, melhor. Quanto mais leite dela ela puder dar no peito, melhor – afirma Ercio.
A inseminação artificial
Luciane se submeteu a uma inseminação artificial, com sêmen de doador desconhecido obtido junto a um banco de sêmen. Após receber uma medicação para estimulação da ovulação, ela teve o esperma introduzido em seu útero. Nessas condições, explica o ginecologista e obstetra Eduardo Pandolfi Passos, responsável pelo procedimento, existe o dobro de chance de ocorrer uma gestação de múltiplos em comparação com o método natural de concepção. Por inseminação artificial (caso de Luciane) ou fertilização in vitro (a fertilização se dá fora do útero, em laboratório, e depois o embrião é introduzido na paciente), a chance de gravidez de gêmeos é de 5% a 6%; de trigêmeos, até 3%; quanto a quadrigêmeos, a estimativa é de que a ocorrência seja inferior a 2%.
Segundo Passos, o objetivo nunca é gerar mais de dois bebês. Na fertilização in vitro, sabe-se exatamente quantos embriões serão transferidos, enquanto na inseminação artificial não há um controle tão preciso, uma vez que a fecundação se dá no corpo da mulher. O organismo de Luciane, explica o médico, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), respondeu de uma forma maior à estimulação da ovulação.