
As primeiras labaredas que atingiam o galpão do Centro de Tradições Gaúchas (CTG) Sentinelas do Planalto, na madrugada desta quinta-feira, puderam ser vistas pelo patrão Gilbert Gisler, o Xepa, da janela de sua própria casa, cerca de cinco minutos após ter deixar o local (confira entrevista abaixo).
A noite havia sido de comemoração no galpão. Até por volta da meia-noite, integrantes do CTG celebravam com um churrasco a conquista do alvará do Corpo de Bombeiros do município - necessário para a realização de um casamento gay e de outros 28 casais heterossexuais no sábado.
Saiba mais:
"Vamos tentar reconstruir o CTG em tempo recorde", afirma juíza
Incêndio atingiu cerca de 40% de CTG que sediaria casamento gay
Ainda bastante abalado, Xepa conversou com Zero Hora na manhã desta quinta. Ele não sabia dimensionar os estragos causados pelo incêndio e informar a possibilidade de a cerimônia ocorrer no galpão, na data e horário previstos. Porém, garantiu:
- A palavra de um homem, de um gaúcho, é como um tiro. Depois que sai, não volta mais. E nós vamos cumprir a nossa palavra. Vamos realizar os 29 casamentos. Vamos realizar o sonho dessas pessoas. Se hetero ou homossexuais não me interessa.
Participe
Qual o motivo para a intolerância em torno do casamento homossexual?
Xepa é vereador em Santana do Livramento. Há um mês, ele havia recebido uma ligação anônima em seu gabinete. Do outro lado, uma mulher denunciava que um grupo estava se preparando para "acabar" com a cerimônia - "nem que para isso tivessem que dar um pau nesse tal de Xepa, dar um jeito na juíza e botar fogo no CTG". A ameaça foi registrada na Polícia Civil.
Confira a entrevista com o patrão do CTG:
O senhor havia recebido ameaças há cerca de um mês. Imaginavam que isso pudesse realmente acontecer?
A gente recebeu algumas ameaças, mas acreditávamos que fossem só boatos. Mas infelizmente essa barbaridade se concretizou. O pior de tudo é a discriminação. O ser humano discriminar outro por sexo, por credo, por qualquer coisa. Temos que acabar com isso. Isso não pode existir mais.
O senhor mora na frente do CTG. Foi possível ver alguma coisa?
Nós estávamos festejando o alvará do Corpo dos Bombeiros. Além do alvará, também o elogio dos bombeiros, por termos cumprido todas as metas, conseguido o PPCI (Planos de Prevenção e Proteção Contra Incêndio). Estava tudo ok, fazíamos um churrasco para festejar. Lá por meia-noite fechei o CTG e fui para casa. Não deu cinco minutos, minha esposa olhou pela janela e viu a labareda. Mas não deu para ver o que realmente ocorreu. A perícia agora trabalha nisso.
E já se sabe a dimensão do prejuízo?
Não tenho ideia. Imagino que tenha sido grande. Pelo comentário das pessoas que tiveram acesso lá, foi grave. Vamos ver até onde foi comprometida a estrutura do CTG.
O casamento sai?
A palavra de um homem, de um gaúcho, é como um tiro. Depois que sai, não volta mais. E nós vamos cumprir a nossa palavra. Vamos realizar o casamento gay e os outros 28 casamentos. Vamos realizar o sonho dessas pessoas. Se hetero ou homossexuais não me interessa, são todos pessoas. Se a estrutura permitir, vamos realizá-lo ainda na Semana Farroupilha. Se pudermos manter tudo como o combinado, vamos manter: a data, o horário, o local, tudo. Não vai ser por esse fato que nós vamos desistir. O Sentinelas do Planalto vai voltar mais forte ainda.
O coordenador do Movimento Tradicionalista Gaúcho da 18ª região do MTG, Rui Rodrigues, se manifestou contra o casamento gay dentro do CTG. Na sua opinião, isso contribuiu para o aumento da hostilidade?
Eu não me refiro a nada do que diz respeito a esse cidadão. Nada a declarar com relação a ele.
Saiba mais
O polêmico casamento gay em um CTG de Livramento
Padronização nas regras do casamento gay completa um ano
Solange Ramires, 24 anos, e Sabriny Benites, 26 anos formam o primeiro par de lésbicas do país a se casar dentro de um centro de tradições gaúchas (CTG). As duas irão se somar a mais 28 casais heterossexuais que trocarão alianças na cerimônia marcada para sábado. O evento tem repercussão internacional, a se julgar pelo interesse demonstrado por jornalistas de outros países. Estão convidadas autoridades do governo do Estado, do Poder Judiciário e do Ministério Público.
Saiba mais:
Solange e Sabriny formam o primeiro casal gay que casará em CTG
"A ideia é garantir os direitos da minoria", diz juíza
Para Solange e Sabriny, é a oportunidade de formalizar uma paixão iniciada há cinco anos. Com o documento de casadas, pretendem contrair um empréstimo para comprar a casa própria.
