
O assassinato da representante comercial Cristine Fonseca Fagundes, de 44 anos, na tarde de quinta-feira, fez a cúpula do governo estadual antecipar uma decisão que vinha sendo amadurecida nos últimos meses: trocar o comando da Secretaria da Segurança Pública. Assim que os detalhes do latrocínio começaram a ser divulgados pela imprensa, secretários e assessores do núcleo duro do Piratini que estavam reunidos na ala residencial do palácio constataram que a situação havia chegado ao limite. A iniciativa de dispensar Wantuir Jacini partiu do vice-governador José Paulo Cairoli, que insistiu na tese de que o governo precisava dar uma resposta à sociedade.
– A morte de uma mãe de família que buscava o filho na escola é algo que não poderia ficar assim – comentou um interlocutor do governador.
Leia mais:
Efetivo de 120 homens da Força Nacional deve chegar a Porto Alegre no domingo
Mulher é morta durante assalto na zona norte de Porto Alegre
Secretário da Segurança Pública do Estado pede exoneração após morte de mulher em frente a escola
Pouco antes do anoitecer, o governador José Ivo Sartori, que estava no Galpão Crioulo do palácio em uma reunião com empresários do Rotary Club, pediu que integrantes do governo se reunissem e buscassem alternativas. A prioridade era "não deixar o Estado dormir sem uma providência do governo", como classificou um dos presentes no encontro. Sartori não quis interromper o encontro.
Em um primeiro momento, Jacini foi sabatinado pelo vice-governador e pelos titulares da Casa Civil, Márcio Biolchi, da Secretaria-Geral de Governo, Carlos Búrigo, da Comunicação, Cleber Benvegnú, do Desenvolvimento, Fábio Branco, e da Fazenda, Giovani Feltes. Enquanto o encontro ocorria, Sartori permanecia no Galpão Crioulo.
O time de secretários exigiu soluções e ideias novas para enfrentar crimes como o latrocínio. Mais uma vez questionado a respeito da convocação da Força Nacional, Jacini repetiu o discurso que adotou desde que assumiu a pasta.
– Não é uma boa ideia. Vamos criar um problema com a Brigada Militar, que vai se sentir desprestigiada, e não vamos resolver a situação – argumentou.
Ninguém do comando da Brigada Militar e da Polícia Civil participou da reunião. O teor era mais político do que técnico. As respostas de Jacini não agradaram. A repetição do discurso incomodou alguns membros do governo.
Nos bastidores do governo, a ideia de exonerar Jacini vinha ganhando corpo nos últimos meses por causa da crise na área. Em vários momentos, o vice-governador, José Paulo Cairoli, tomou a frente de discussões sobre ações da pasta, principalmente quando assumiu interinamente o cargo de governador. A avaliação do Piratini era de que, sob a liderança de Cairoli, as respostas das corporações às demandas do governo estavam sendo melhores do que quando Jacini comandava. Ou seja, o vice-governador demonstrava o pulso que faltava ao secretário.
Leia mais:
ÁUDIO: em depoimento, preso diz que comparsa atirou "sem querer"
"Temos que reconhecer que a situação é muito difícil", afirma Sartori ao chegar a Brasília
"Era uma batalhadora", diz irmão de mulher morta ao buscar filho na escola
Foi com esse ímpeto que Cairoli pediu a autorização de Sartori para demitir Jacini. Em pelo menos duas oportunidades, incomodado com as alternativas apresentadas pelo ex-secretário, o vice-governador deixou a reunião para falar pessoalmente com o governador. Na última ocasião, Cairoli disse que não via outra alternativa a não ser montar o gabinete de crise – o que implicava a saída de Jacini – e solicitou carta-branca para promover a mudança. No jardim do Piratini, ao lado dos secretários Márcio Biolchi e Cleber Benvegnú, Sartori autorizou a saída de Jacini e retornou para o Galpão Crioulo.
A ideia de montar o grupo sob o comando de Cairoli se materializou com o convencimento de que Jacini não poderia oferecer nada de diferente para o momento do Estado. Aos poucos, os integrantes do núcleo político começaram a, sutilmente, sugerir ao próprio secretário que ele deixasse o cargo. Quem conduziu a conversa final acabou sendo o chefe da Casa Civil, Márcio Biolchi, já consciente da decisão do governador de afastar Jacini. Sem decretar a demissão do colega, Biolchi fez um apanhado do quanto a situação era difícil e o ex-secretário percebeu o que aquilo significava.
– Se essa é a questão, peço a minha exoneração. Tinha muita vontade de ajudar o meu Estado, mas não imaginava encontrar tantas dificuldades – lamentou Jacini.
O pedido foi imediatamente aceito. Em um primeiro momento, por cerca de 30 dias, o vice-governador será o virtual secretário da Segurança Pública. A ideia de que ele assuma a função é vista com carinho pelo núcleo político do governo. Isso porque Cairoli é um sujeito de posições bem definidas, firme no trato e nos comandos, qualidades que podem fazer a diferença neste momento de crise intensa no setor. Não existem nomes cotados para a secretaria, exceto o dele mesmo. Alguns políticos já foram completamente descartados, caso de Enio Bacci (PDT) e de Edson Brum (PMDB). O governador não quer um secretário de perfil midiático. Prefere alguém que conjugue conhecimento técnico e pulso firme (característica essa que não era o forte de Jacini).
Outras alternativas são estudadas pelo governo, entre elas a extinção da Secretaria da Segurança, deixando os comandos da BM e da Polícia Civil subordinados ao gabinete do governador ou do vice. A administração dos presídios ficaria vinculada à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos. Ao longo das próximas semanas, a cúpula do governo realizará reuniões frequentes para avaliar o funcionamento do gabinete de crise e projetar os próximos passos. Uma das medidas que devem ser anunciadas por Cairoli nos próximos dias é a antecipação da convocação de uma segunda leva de policiais militares, além dos 530 chamados neste mês.
Leia as últimas notícias