
A cada problema ao longo do último ano, o brasileiro repetia, prevendo sempre o pior: "Imagina na Copa". Pois ela veio, completa neste sábado o seu décimo dia e, por incrível que pareça, está bem melhor do que havíamos imaginado.
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Aeroportos
O que se temia
Os aeroportos brasileiros eram tidos como a aposta mais certeira de caos durante o Mundial. Como já são precários em condições normais, achava-se que virariam um inferno com a chegada de milhares de torcedores estrangeiros.
Como foi até agora
A surpresa apareceu dias antes da Copa, quando o ex-jogador dos Estados Unidos Alexi Lalas desembarcou no país e elogiou: "O aeroporto do Rio foi melhor e mais rápido do que qualquer um dos Estados Unidos. Aterrissamos, passamos pela alfândega e pegamos as malas em 32 minutos".
A situação continuou tranquila dali em diante, apesar de obras inacabadas em alguns terminais e da tradição da Infraero de nunca cumprir uma promessa. O caos não ocorreu, ao menos em parte, porque muita gente preferiu não viajar durante a Copa por receio de problemas.
Os principais percalços ocorreram por causa da neblina. A eterna espera de Porto Alegre pelo ILS-2, equipamento que permite operações com baixa visibilidade e que finalmente foi liberado na sexta-feira, reteve torcedores no terminal em algumas manhãs.
No Rio, o nevoeiro impediu que torcedores belgas e argelinos embarcassem a tempo para ver suas seleções em Belo Horizonte.
Mobilidade
O que se temia
O miserável sistema de transporte público brasileiro, somado a greves em dias de jogo, tornaria a experiência de ir ao estádio - para quem conseguisse chegar ao estádio - em uma via crúcis.
Como foi até agora
As duas questões mais delicadas - greves nos metrôs do Rio e de São Paulo - foram resolvidas às vésperas do início da Copa. Foi um alívio e tanto. Se os trens não tivessem andado, a única maneira de chegar sem maiores complicações aos estádios estaria fora de cogitação.
Com os metrôs funcionando, o acesso foi bem sucedido. O maior problema ocorreu em Natal, com greve dos ônibus durante a competição - uma dor de cabeça para os torcedores.
Porto Alegre resolveu o problema da chegada ao Beira-Rio de forma magistral: criou o Caminho do Gol, um itinerário de mais três quilômetros entre o Centro e o estádio para ser feito a pé. Em lugar de ser um empecilho, o trajeto virou uma grande festa ambulante, transformando-se em um diferencial da cidade nesta Copa.
Hospitalidade
O que se temia
Revoltados com o desperdício de dinheiro público na Copa, os brasileiros boicotariam o evento e tratariam mal os turistas. Já os prestadores de serviços se aproveitariam dos pobres-coitados, cobrando valores extorsivos.
Como foi até agora
No começo, nem parecia Copa. Mas, com o passar dos dias, as bandeiras foram aparecendo por todo o lado. Os estrangeiros, que nos primeiros dias se queixavam da apatia da torcida canarinho, agora elogia um povo que vive e respira futebol. A verdade é que eles foram recebidos bem. E, ao menos por enquanto, não houve queixas de comerciantes ou taxistas carregando nos preços.
O impacto no comércio não foi dos maiores, ainda que as vendas de material esportivo e de roupas para turistas surpreendidos pelo frio tenham sido boas. Quem está faturando mesmo - até o dobro do esperado - são bares e restaurantes.
A prefeitura precisou fechar a Rua Lima e Silva por duas noites, tamanha a concentração de estrangeiros nos botequins.
Fan fests
O que se temia
Feudos da odiada Fifa no meio das cidades-sede, onde não se pode entrar com comida e bebida e os bares praticam preços proibitivos, teriam dificuldade para atrair público.
Como foi até agora
Apesar da capacidade para 20 mil pessoas,faltou lugar na fan fest de Porto Alegre durante o jogo entre Brasil e México. Foi o ápice de um evento que começou de forma tímida, na Capital, mas acabou se consolidando como uma grande atração, mesmo em dias de jogos menos badalados.
O sucesso não se deu por causa das apresentações musicais - aqui não apareceram grandes estrelas, como outras cidades -, mas pelo fato de a fan fest ter se revelado um ponto de confluência dos turistas de diversas partes do mundo - e que se transformaram, eles próprios, em uma espécie de atrativo turístico para os nativos.
Foram mais de 100 mil visitantes na primeira semana. Se por aqui deu certo, em outras cidades brasileiras, agraciadas com clima mais quente e maior quantidade de turistas, elas viraram uma febre.
Turistas
O que se temia
O temor de protestos, a falta de segurança, a infraestrutura precária e as notícias negativas publicadas na imprensa internacional fariam da Copa um evento testemunhado basicamente por brasileiros.
Como foi até agora
Há relatos de gente que não veio, especialmente da Europa, assustada com o padrão Brasil. Mas os latino-americanos aproveitaram a proximidade e desembarcaram em peso, lotando estádios e oferecendo às suas seleções todas vantagens do fator local. O governo brasileiro estima que serão 600 mil visitantes de 186 países, que vão gastar R$ 6,7 bilhões por aqui.
Mas já começam a ocorrer revisões para cima. Só pelo Estado, já ingressaram no país mais de 20 mil turistas - fora os gringos que fizeram sua entrada por outras unidades da federação. Nos jogos da Capital, mais de 80 mil ingressos foram adquiridos por forasteiros. Hondurenhos, franceses, holandeses e australianos mudaram a cara da cidade. E ainda há os argentinos por vir.
Protestos
Foto: Ronaldo Bernardi / Agência RBS
O que se temia
Após milhares de brasileiros saírem às ruas durante a Copa das Confederações, no ano passado, acreditava-se que levantes populares similares pudessem ocorrer, tornando realidade o bordão dos radicais: "Não vai ter Copa".
Como foi até agora
Sabe-se de estrangeiros que deixaram de vir ao Brasil por medo das manifestações violentas. E os protestos aconteceram, como se previa, mas a Copa vai bem, obrigado. No dia da abertura do evento, centenas de manifestantes se mobilizaram em São Paulo, ainda que a quilômetros de distância do Itaquerão, e receberam atenção da imprensa internacional - houve até jornalistas feridos.
Mas, depois do início da Copa, os protestos ficaram em um plano muito secundário. Uma razão para isso é que, desta vez, pelo menos até aqui, não tiveram adesão popular. Em Porto Alegre e outras cidades-sede, as manifestações, algumas violentas, foram realizadas por grupos pequenos, às vezes menos numerosos do que os de jornalistas.
Segurança pública
O que se temia
Uma onda de crimes contra turistas mancharia a imagem do país. Dizia-se até que a organização criminosa PCC estava se organizando para promover o terror durante a Copa.
Como foi até agora
O primeiro motivo de alívio é que nenhum crime de maior gravidade, como homicídio ou estupro, ocorreu nos primeiros dias de Copa. As ocorrências são quase todas de assaltos, furtos ou agressões. A segunda boa notícia é que a quantidade de ocorrências está dentro do razoável.
Em Porto Alegre, foram 13 casos envolvendo estrangeiros, menos de dois por dia. Holandeses e australianos elogiaram o policiamento, que tem sido maciço na área central.
Entre os casos de maior repercussão, há o de um jornalista alemão que surtou ao ter o iPhone roubado em Manaus, quando embarcava em um ônibus, e publicou um texto raivoso no site de seu jornal. Os próprios alemães reagiram ao relato de forma negativa, o que levou os editores do periódico a suprimir trechos do texto.
Obras inacabadas
O que se temia
Do que foi prometido para a Copa, quase nada ficou pronto. Até mesmo estádios seguiam em obras na véspera das partidas. Tinha tudo para ser um desastre. A imprensa internacional previa uma catástrofe.
Como foi até agora
O Itaquerão, em São Paulo, serviu de palco para a partida inaugural sem estar completamente acabado e sem ter sido devidamente testado - mas não comprometeu, para surpresa geral. Pode-se dizer o mesmo dos outros estádios.
Em Porto Alegre, o entorno do Beira-Rio só foi finalizado na última hora - e gerou críticas de jornalistas estrangeiros por conta de alguma precariedade. Mas quem sofreu mais por causa das obras que não ficaram prontas foi o próprio porto-alegrense.
No dia do jogo entre Austrália e Holanda, os moradores da zona sul enfrentaram congestionamentos infernais, porque a prometida Avenida Tronco não foi terminada a tempo. De forma geral, os estrangeiros, que previam o caos, têm elogiado a estrutura oferecida nas cidade-sede.
Operação nos estádios
O que se temia
Estádios terminados na última hora, em um padrão com o qual o Brasil não está habituado, desembocariam em tumultos nos dias de jogo. Assistir a uma partida se transformaria em um teste para a paciência.
Como foi até agora
A operação dos estádios tem estado dentro do aceitável. Houve problemas, como no caso dos banheiros insuficientes do Beira-Rio, da não-execução dos hinos na partida entre França e Honduras, dos refletores que se apagaram no Itaquerão ou dos episódios de retenção de público junto aos bloqueios do entorno, fazendo o torcedor entrar atrasado em diferentes arenas.
Curiosamente, as principais falhas não se deveram à organização brasileira, mas à Fifa. A mais grave delas foi o incidente em que torcedores chilenos sem ingressoinvadiram o Maracanã. Outro problema irritante é a falta de preparo dos bares nos estádios: tem faltado comida e as filas são intermináveis, o que acaba resultando em arquibancadas vazias durante os jogos.
